Richard Swinburn
Emeritus Nolloth Professor of the Philosophy of the
Christian Religion, University of Oxford. [Conferência apresentada no
Departamento de Filosofia da UFRN, no dia 22 de novembro de 2007. Título
original: “The Existence of God”.]
Tradução de Edrisi Fernandes.
As práticas da religião cristã, judaica ou islâmica
só têm uma razão de ser se existe um Deus - não há motivo para cultuar um
criador inexistente. Que fenômenos evidentes para todos, e em particular o
universo e sua ordem, fornecem bons fundamentos para acreditar que Deus existe
tem sido uma convicção geral cristã, judaica e islâmica. A produção de
argumentos para mostrar isso é chamada “teologia natural”. Em minha conferência
eu apresento uma teologia natural moderna. Reivindico que supor que existe um
Deus explica porque, por algum motivo, existe um universo físico; porque
existem as leis científicas existentes; porque animais e depois seres humanos
evoluíram; porque os homens são conscientes; porque os humanos têm a
possibilidade de moldar seu caráter e aquele de seus congêneres para o bem ou
para o mal e para mudar o ambiente em que vivemos; porque através dos séculos
milhões de pessoas (que não nós) tiveram a aparente experiência de estar em
contato com e serem guiadas por Deus, e muitos outros fenômenos. Cada um desses
fenômenos citados formou o ponto inicial de um argumento a favor da existência
de Deus. Os argumentos me parecem ter um padrão comum. Algum fenômeno E, que
todos nós podemos observar (por exemplo, que existem certas leis científicas particulares),
é considerado. Reivindica-se que é provável que E ocorreria se existe um Deus,
mas é improvável que E fosse ocorrer se não existe um Deus; pois Deus tem o
poder de fazer ocorrer E e (sendo perfeitamente bom) ele bem poderia escolher
fazer os humanos existirem, e assim aqueles fenômenos que são necessários para
a sua existência. A existência de Deus é uma hipótese bastante simples que
explica E, uma vez que – conforme postulado – ele é onipotente, onisciente e
perfeitamente livre (e, daí, uma pessoa do tipo mais simples que pode existir),
do que se segue que ele é perfeitamente bom. Daí, a ocorrência de E é evidência
para se supor que existe um Deus. Argumentos desse tipo são argumentos
indutivos a favor da causa dos fenômenos citados como evidência nas premissas,
e são do padrão normal do argumento a favor causas na história e na ciência.
Detetives usam esse padrão de argumento para argumentar a favor de uma hipótese
sobre quem cometeu um crime, e cientistas usam esse padrão de argumento para argumentar
a favor da existência de entidades não-observáveis como causas dos fenômenos
que eles observam. Os argumentos da teologia natural são cumulativos – cada
argumento faz crescer a probabilidade de que existe um Deus; juntos eles a
tornam bastante provável. Nessa conferência apenas terei tempo de considerar
argumentos dos primeiros três fenômenos mencionados acima. Mas, junto com
argumentos a partir de outros fenômenos (e assumindo que têm pouca força
argumentos contra a existência de Deus a partir de outros fenômenos),
reivindico que a hipótese da existência de Deus faz sentido a partir do [ou dá
sentido ao] conjunto de nossa experiência, e faz isso melhor que qualquer outra
explicação que pode ser apresentada, e isso é o fundamento para se acreditar que
seja verdadeira.
Porque, por algum motivo, acreditar que existe um
Deus? Minha resposta é supor que supor que existe um Deus explica o motivo da
existência de um universo físico; porque existem as leis científicas
existentes; porque animais e depois seres humanos evoluíram; porque os homens
são conscientes; porque os humanos têm a possibilidade de moldar seu caráter e
aquele de seus congêneres para o bem ou para o mal e para mudar o ambiente em
que vivemos; porque temos o bem autenticado relato da vida, morte e
ressurreição do Cristo; porque através dos séculos milhões de pessoas (que não
nós) tiveram a aparente experiência de estar em contato com e serem guiadas por
Deus, e muito mais. De fato, a hipótese da existência de Deus faz sentido a
partir do [ou dá sentido ao] conjunto de nossa experiência, e faz isso melhor
que qualquer outra explicação que pode ser apresentada, e isso é o fundamento
para se acreditar que seja verdadeira. Nessa conferência tentarei mostrar como
ela [essa hipótese] faz sentido a partir dos [ou dá sentido aos] primeiros três
desses fenômenos.
Que fenômenos evidentes para todos, e em particular
o universo e sua ordem, fornecem bons fundamentos para acreditar que Deus
existe tem sido uma convicção geral cristã, judaica e islâmica. A produção de
argumentos para mostrar isso é chamada “teologia natural”, e pode ser útil
começar com algumas ponderações sobre o lugar da teologia natural na tradição
cristã.
O profeta Jeremias escreveu sobre a “aliança entre
o dia e a noite” (Jr 33:25-26), indicando que a regularidade com que o dia
sucedia a noite mostrava que o deus encarregado do Universo era poderoso e
confiável, ou seja, que deus era Deus. A literatura sapiencial do Velho
Testamento desenvolveu a idéia de que os detalhes da criação mostravam muito
sobre o Criador. São Paulo escreveu que as “coisas invisíveis” de Deus “são
claramente vistas, sendo percebidas através das coisas que são feitas”(Rm
1:20), e que os pagãos poderiam ver por eles mesmos. Essa tradição bíblica
misturou-se no mundo grego tardio com os argumentos de Platão e Aristóteles a
favor da existência de uma suprema força do ser. E assim vários teólogos
cristãos, no oriente e no ocidente, tiveram seu parágrafo ou dois sumarizando
um argumento a favor de Deus a partir da existência ou ordem do universo –
entre os quais Irineu, Gregório de Nissa, Agostinho, Máximo o Confessor e João
Damasceno. Mas é normalmente apenas um parágrafo ou dois, e o raciocínio é
rápido. Minha explicação sobre porque eles destinaram tão pouca energia a esse
assunto é que eles não sentiram qualquer necessidade de fazer mais. A maior
parte de seus contemporâneos aceitavam que existiam deuses ou um Deus. O que os
teólogos precisavam argumentar é que existia apenas um Deus assim, e que ele
tinha certas características cristãs específicas e que tinha agido na história
de certos modos particulares.
Com a chegada do segundo milênio, contudo, os
teólogos do ocidente medieval e, sobretudo, Tomás de Aquino e Duns Escoto,
começaram a produzir argumentos de considerável extensão e rigor a favor da
existência de Deus, e essa empreitada de teologia natural continuou
ininterruptamente na tradição católica até o século XIX. Os protestantes
clássicos, contudo, embora acreditando que o mundo natural mostrava evidência
abundante de seu criador, pensaram que a pecaminosidade humana obscurecia nossa
habilidade de reconhecer essa evidência, e que em todo caso existiam melhores
modos de vir a conhecer a Deus. Por outro lado, os protestantes liberais
(particularmente aqueles da Grã-Bretanha do século XVIII) argumentaram com
alguma extensão “desde a natureza até o Deus da natureza”. Muitos deles viram
as maravilhas da natureza, especialmente aquelas novas maravilhas registradas
pelo microscópio e pelo telescópio, como evidência nova e positiva da
existência de Deus, e eles quiseram impulsionar seus contemporâneos
religiosamente morosos a maravilharem-se. Mas finalmente no século XIX uma
combinação do que eu vejo como razões muito ruins derivadas de Hume, Kant e
Darwin levaram ao abandono do antigo projeto da teologia natural por muitas
partes da tradição cristã. Isso foi desafortunado – pois a cristandade (e
qualquer outra religião teísta) precisa da teologia natural.
As práticas da religião cristã (e de qualquer outra
religião teísta) apenas têm uma razão de ser se existe um Deus – não existe
razão para cultuar um criador inexistente ou para pedir a ele para fazer algo
na Terra ou levar-nos para o Céu se ele não existe; ou para tentarmos viver
nossas vidas de acordo com sua vontade, se ele não tem qualquer vontade. Nos
primeiros séculos e no medievo a maior parte as pessoas criadas como cristãos
simplesmente tomaram a existência de Deus como ponto pacífico. A maior parte
dos convertidos pode ter acreditado preliminarmente que existe um Deus; a sua
conversão envolveu a aceitação de reivindicações mais detalhadas sobre ele. E
se os cristãos duvidavam, ou os convertidos não acreditavam inicialmente, que
existe um Deus, muitos deles podem ter vindo a acreditar, com base na
experiência religiosa, em algum sentido ou testemunho, ao invés de com base na
teologia natural. Isso teria sido racional. É, de fato, um princípio básico da
crença racional – que eu chamo de Princípio da Credulidade – que aquilo que a
você parece, com base na experiência, ser de um tal modo, provavelmente é desse
modo – na ausência de uma contra-evidência. Se lhe parece que você me vê
recostar-me no púlpito ou escutar minha voz, então provavelmente você o faz – a
não ser que você acorde e descubra que foi tudo um sonho, ou que alguém lhe
mostre que na realidade não há qualquer púlpito ali; o que parece ser um
púlpito é na realidade um holograma. E isso é também um princípio básico da
crença racional, o qual eu chamo de Princípio do testemunho, que aquilo que as
pessoas lhe dizem provavelmente é verdade – na ausência de uma
contra-evidência. E assim, se seus professores lhe disseram que a Terra tem
milhões de anos de idade, ou se você lê num jornal que houve um terremoto na
Turquia, essas coisas provavelmente são assim – a não ser que você aprenda algo
que lance dúvidas sobre elas. Quando a dúvida é lançada, necessitamos
argumentos positivos para mostrar que há um púlpito ali, ou que a Terra tem
milhões de anos de idade. Não pode haver justificação para não se estender
esses princípios gerais da racionalidade ao caso da crença religiosa. Se você
teve uma experiência aparentemente de Deus, você provavelmente a teve, e se
seus professores lhe dizem que existe um Deus, é racional acreditar neles – na
ausência de uma contra-evidência. Uma contra-evidência pode assumir muitas
formas – o fato de haver dor ou sofrimento pode parecer incompatível com a
existência de Deus ou torná-la improvável, e professores rivais podem lhe dizer
que não existe Deus. A contra-evidência pode ser forte ou fraca, e mesmo se for
consideravelmente forte pode (racionalmente) não perturbar a crença de alguém
que acredita na autoridade de alguém que teve uma experiência religiosa
decisivamente forte ou que acredita na autoridade de inumeráveis professores de
antecedentes diversos. Mas geralmente a presença de contra-evidência deixa em
aberto a questão da existência de Deus, que então precisa ser sustentada por
argumentos positivos (e/ou ter seus argumentos contrários refutados) se a
crença de que Deus existe é para ser racional. E a maior parte dos pensadores
cristãos antes de 1850 acreditaram que existiam bons argumentos da teologia
natural disponíveis para aqueles que não tinham qualquer razão, ou suficiente
razão, para acreditar em Deus com base na experiência ou do testemunho. Mas
desde que existe bem mais dúvida sobre a existência de Deus no ocidente cético
de hoje que na maior parte das culturas e dos séculos precedentes, a
necessidade da teologia natural é bem maior do que jamais foi antes – tanto
para aprofundar a fé do crente quanto para converter o incrédulo.
Os medievais – e Tomás de Aquino paradigmaticamente
– tentaram deslocar a razão desde o mundo até Deus sob a forma de um argumento
dedutivo. Mas tudo que um argumento dedutivo pode fazer é extrair de sua
conclusão aquilo a que você já está predisposto pelas suas premissas. Um
argumento dedutivo válido é aquele no qual se você afirma a premissa ou
premissas mas nega a conclusão você contradiz a si mesmo. Por exemplo, há um
argumento dedutivo válido desde “todos os homens são mortais” e “Sócrates é um
homem” (premissas) até “Sócrates é mortal” (conclusão); e desde “a mesa é
marrom” até “a mesa é colorida”. Seria auto-contraditório dizer “a mesa é
marrom, mas não colorida”. Mas é muito implausível supor que um argumento [que
vá] desde “há um universo físico” (e/ou desde quaisquer evidentes traços gerais
do universo) para “existe um Deus” é assim. Pois uma afirmação razoavelmente
evidente como “existe um universo físico, mas nenhum Deus” (o quão irracional que
possa ser acreditar nela) não contém qualquer contradição interna. Não é como
“a mesa é marrom, mas não colorida”. “Existe um Deus” vai além das premissas ao
afirmar a existência ou ordem do universo, vai até algo bem maior. Mas um
argumento que se propõe a ser válido e não é, é inválido. E nos séculos
subjacentes a Tomás de Aquino muitas pessoas indicaram as detalhadas falácias
nos seus argumentos.
Contudo, um argumento que vai da existência e ordem
do Universo até a existência de Deus é melhor representado não como dedutivo,
mas como indutivo – um argumento no qual as premissas fazem a conclusão
provável até certa medida, talvez bastante provável, mas não certa. Todos os
argumentos na ciência e na história desde a evidência até a teoria são
indutivos, mas Aristóteles e seus sucessores que tentaram (com sucesso
moderado) codificar as formas válidas de argumento dedutivo tinham muito pouco
entendimento da distinção entre dedução e indução, para não falar dos critérios
de um bom argumento indutivo. Apenas hoje estamos começando a ter alguma
compreensão da indução. Um traço dos argumentos indutivos é que eles são
cumulativos. Uma parte de evidência afirmada em uma premissa pode oferecer uma
certa quantidade de probabilidade à conclusão; outra parte de evidência pode
aumentar essa probabilidade. E se argumentos a partir do universo e sua ordem
ocasionam apenas uma conclusão provável, e não uma certa, há espaço para que a
experiência religiosa e a tradição tornem a conclusão ainda mais provável.
Quero agora argüir que três argumentos – da existência do universo, da
existência de leis científicas simples e dessas leis levando à evolução de
seres humanos – são fortes argumentos indutivos a favor da existência de Deus.
Não haverá tempo em minha conferência para discutir outros argumentos, ou para
discutir o argumento principal contra a existência de Deus a partir do mal ou
do sofrimento (embora vocês possam querer levantar esses tópicos no tempo
reservado à discussão).
Cada um dos fenômenos aos quais me referi no começo
da conferência formou o ponto inicial de um argumento a favor da existência de
Deus. Parece-me que esses argumentos têm um padrão comum. Algum fenômeno E, que
todos nós podemos observar, é considerado. Alega-se que E é enigmático,
estranho, inesperado no curso ordinário das coisas, mas que deve-se esperar E
se existe um Deus, pois Deus tem o poder de fazer ocorrer E, e ele bem pode
escolher fazer isso. Donde a ocorrência de E ser razão para se supor que existe
um Deus.
Esse tipo de argumento é muito usado em ciência,
história, e em todos os outros campos da investigação humana. Um detetive, por
exemplo, encontra várias pistas – as impressões digitais de John em um cofre
roubado, o fato de John ter bastante dinheiro escondido em sua casa, o fato de
John ter sido visto próximo à cena do roubo na ocasião em que ele foi cometido.
Ele então sugere que essas várias pistas, embora possam bem ter outras
explicações, em geral não são esperáveis exceto se John tiver roubado o cofre.
Cada pista é evidência parcial (some) de que ele roubou mesmo o cofre, e
confirma a hipótese de que John roubou o cofre, e a evidência é cumulativa –
quando coletada ela torna a hipótese provável.
Argumentos desse tipo são argumentos indutivos da
causa dos fenômenos citados como evidência nas premissas. Os cientistas usam
esse tipo de argumento para argumentar a favor da existência de entidades
não-observáveis como causas dos fenômenos que eles observam. Por exemplo, no
começo do século XIX os cientistas observaram muitos fenômenos variados de
interação química, de um modo tal que as substâncias se combinam em proporções
fixas por peso para formarem novas substâncias (p.ex., o hidrogênio e o
oxigênio sempre formam água numa proporção de 1:8 por peso). Eles então
alegaram que esses fenômenos seriam de se esperar se existissem cem, ou perto
disso, diferentes tipos de átomos, partículas demasiado pequenas para serem
vistas, que se combinavam e recombinavam em certos modos simples. Por sua vez,
os físicos postularam elétrons, prótons, nêutrons e outras partículas, de modo
a dar conta do comportamento dos átomos, bem como de fenômenos observáveis em
maior escala, e agora eles postulam quarks de modo a explicar o comportamento
de prótons, nêutrons e outras partículas.
Para serem bons argumentos (isso é, para fornecer
evidência para as suas hipóteses), argumentos desse tipo precisam satisfazer
quatro critérios. Primeiro, os fenômenos que eles citam como evidência devem
ser fenômenos que se espera que ocorram (isso é, é consideravelmente provável que
eles venham a ocorrer) se a hipótese é verdadeira. Se John roubou mesmo o cofre
é bastante provável que suas impresses digitais seriam encontradas nele. Em
segundo lugar, os fenômenos devem ser menos prováveis de ocorrer no curso
normal das coisas, isto é, se a hipótese é falsa. Vimos no exemplo do roubo
como as várias pistas, tais como as impressões digitais de John no cofre, não
seriam muito de se esperar no curso normal das coisas. Em terceiro lugar, a
hipótese deve ser simples; isto é, ela deve postular a existência e a operação
de poucas entidades, com poucas propriedades facilmente descritíveis,
comportando-se de modos matematicamente simples. Sempre poderemos postular
muitas entidades novas com propriedades complicadas para explicar algo que
acharmos. Mas nossas hipóteses só serão sustentadas pela evidência se ela
postular poucas entidades que nos levem a esperar os diversos fenômenos que
formam a evidência. Desse modo, no exemplo da estória de detetive poderíamos
supor que Brown “plantou” as impressões digitais de John no cofre, que Smith se
vestiu para ficar parecido com John na cena do crime, e que, sem qualquer
conluio com os outros, Robinson escondeu o dinheiro no apartamento de John.
Essa nova hipótese nos levaria a esperar os fenômenos tanto quanto a hipótese
que John roubou o cofre. Mas a última hipótese é confirmada pela evidência,
enquanto a primeira não é. E isso ocorre porque a hipótese de que John roubou o
cofre postula um objeto – John – fazendo uma ação – roubar o cofre – o que nos
leva a esperar os diversos fenômenos que encontramos. Os cientistas sempre
postulam tão poucas entidades novas (p.ex., partículas subatômicas) quantas são
necessárias a nos levar a esperar encontrar os fenômenos que observamos, e eles
postulam que essas entidades não se comportam erraticamente (se comportam de um
modo num dia e de modo diferente no outro), mas que elas se comportam de acordo
com uma lei matemática tão simples e fácil quanto for compatível com o que é
observado. E em quarto lugar, a hipótese deve se adequar ao nosso conhecimento
sobre como o mundo opera em campos mais amplos, aquilo que devo chamar de nosso
conhecimento de fundo. A hipótese de que John roubou o cofre deve se adequar
àquilo que sabemos de outras ocasiões sobre se John freqüentemente rouba
cofres, Mas quando estamos lidando com uma hipótese que se propõe a explicar
uma vasta amplitude (range) de fenômenos, esse critério tende a ser derrubado –
posto que não haverá campos de investigação mais amplos nos quais tenhamos
conhecimento substancial sobre como as coisas operam. Não estava disponível nem
havia conhecimento de fundo de campos de investigação mais amplos com os quais
a teoria gravitacional newtoniana tivesse que se adequar quando Newton a
apresentou em 1689 (por exemplo, inexistia um conhecimento sistemático da
eletricidade ou do magnetismo). Nem existe hoje em dia um conhecimento tal para
garantir as chamadas “teorias de tudo”, que os físicos vêm postulando, teorias
que se propõem a explicar todos os fenômenos físicos. E esse critério não será
relevante para garantir a hipótese do teísmo – que existe um Deus – que é
apresentada como a verdadeira “teoria de tudo” (uma hipótese mais geral que a
mais ampla hipótese da física, ao se propor a explicar porque uma teoria assim
é apropriada e a explicar não meramente os fenômenos físicos, mas também a vida
consciente). Um argumento indutivo a favor de uma causa será tanto mais forte
quão melhor satisfeitos forem os quatro critérios, isto é, quanto mais
plausível for que os fenômenos venham a ocorrer se e somente se a causa
postulada ocorrer, quanto mais simples for a causa postulada, e – se relevante
– o quão melhor a explicação se adeqüe ao conhecimento de fundo. Quão melhor os
critérios são satisfeitos, mais provável é que a explicação proposta seja
verdadeira.
O fenômeno mais geral que fornece evidência a favor
da existência de Deus é a existência do universo físico pelo tempo em que ele
tem existido (seja num tempo finito ou, se ele não tem um começo, um tempo
infinito). Isso é algo evidentemente não explicável pela ciência, pois uma
explicação científica dessa natureza explica a ocorrência de qualquer estado de
coisas S1 em termos de um estado prévio de coisas S2 e de alguma lei da
natureza que faz com que estados como S2 façam ocorrer estados como S1. Assim,
ela pode explicar as posições atuais dos planetas por um estado prévio do
sistema (estando o sol e os planetas onde eles estavam ano passado) e a
operação das leis de Kepler, que afirmam que estados como o último [S2] são
acompanhados um ano depois por estados como o primeiro [S1]. Mas o que a
ciência, por sua natureza intrínseca não pode explicar é porque, por algum
motivo, existem quaisquer estados de coisas.
Meu próximo fenômeno é a operação das leis mais
gerais da natureza, isto é, a conformação da ordem da natureza às leis bastante
gerais da física e às regularidades da química. Seguimos aqui exatamente aquilo
que as leis mais gerais da ciência podem ainda não ter descoberto – talvez, que
existem equações de campo da Teoria Geral da Relatividade de Einstein, ou mais
provavelmente, que existem algumas leis ainda mais fundamentais, talvez as leis
de uma “Teoria de Tudo”. Agora a ciência pode explicar porque uma lei opera em
alguma área estreita, em termos da operação de uma lei mais ampla nas condições
particulares daquela área estreita. Assim ela pode explicar porque se sustenta
a lei da queda [dos corpos] de Galileu - que pequenos objetos próximo à
superfície da Terra caem com uma aceleração constante em direção à Terra. A lei
de Galileu decorre das leis de Newton, dado que a Terra é um corpo massivo
longe de outros corpos massivos e que os objetos em sua superfície estão pertos
dela e têm massa comparativamente menor. Mas o que a ciência, por sua natureza
intrínseca, não pode explicar, é porque existem as leis mais geral da natureza
existentes, pois ex hypothesi não há leis mais amplas que possam explicar sua
operação.
Que existe um universo e que existem leis da
natureza são fenômenos tão gerais e difundidos que tendemos a ignorá-los. Mas,
de modo semelhante, facilmente também poderia não existir, nem ter existido
nunca, um universo. Ou o Universo poderia, de modo igualmente fácil, existir
como uma confusão caótica. Que existe um Universo ordenado é algo muito
pungente, ainda [ou: e no entanto] longe da capacidade de explicação da
ciência. A inabilidade da ciência em explicar essas coisas não é um fenômeno
temporário, causado pelo atraso da ciência do século XXI.
Ao invés disso, em virtude do que uma explicação
científica é, essas coisas sempre estarão além de sua capacidade explicativa.
Pois as explicações científicas, por sua própria natureza, terminam com alguma
lei natural suprema ou arranjo supremo das coisas físicas, e as questões que
estou levantando dizem respeito a porque existem quaisquer leis naturais ou
coisas físicas.
Contudo, existe outro tipo de explicação de
fenômenos que usamos o tempo todo e que vemos como um modo apropriado de
explicar fenômenos. Isso é o que chamo de explicação pessoal. Freqüentemente
explicamos algum fenômeno E como tendo sido feito acontecer por uma pessoa P de
modo a alcançar algum propósito ou meta G. O movimento presente dos meus lábios
é explicando como feito acontecer por mim com o propósito de fazer uma
conferência. O fato do copo estar sobre a mesa se explica por alguém tê-lo
posto lá com o propósito de se beber dele. No entanto, essa maneira de explicar
as coisas é diferente da científica. A explicação científica envolve leis da
natureza e estados prévios de coisas. A explicação pessoal envolve pessoas e
suposições. Se não podemos dar uma explicação científica para a existência e
ordem do Universo, talvez possamos dar uma explicação pessoal.
Mas porque devemos pensar que a existência e a
ordem do Universo têm uma explicação qualquer? Buscamos por uma explicação de
todas as coisas, mas vimos que apenas temos razão para supor que encontramos
uma se a explicação proposta é simples e nos leva a esperar o que encontramos
quando, de outro modo, isso não é para ser esperado. A história da ciência mostra
que julgamos que fenômenos que são muitos e complexos necessitam explicação, e
que eles são para ser explicados em termos de algo mais simples. Os movimentos
dos planetas (sujeito às leis de Kepler), as interações mecânicas dos corpos na
Terra, o comportamento dos pêndulos, os movimentos das marés, o comportamento
dos cometas etc., formaram uma coleção bastante diversificada de fenômenos. As
leis do movimento de Newton constituíram uma teoria simples que nos levou a
esperar esses fenômenos, e assim foi considerada uma explicação verdadeira para
eles. A existência de milhares de substâncias químicas diferentes combinando-se
em diferentes proporções para fazer outras substâncias era complexa. A hipótese
de que existiam apenas cem, ou perto disso, elementos químicos dos quais os
milhares de substâncias foram feitas era uma hipótese simples que nos levou a
esperar o fenômeno complexo.
Nosso Universo é uma coisa complexa. Existem muitos
e muitos pedaços separados de material no universo. Cada pedaço tem volume,
forma, massa etc. diferentes, finitos e não muito naturais – considere a vasta
diversidade das galáxias, estrelas e planetas, e pedregulhos na praia. A
matéria é inerte e não tem poderes que possa escolher exercer; ela faz o que
ela tem de fazer. Existe uma quantidade limitada dela em qualquer região e ela
tem uma quantidade limitada de energia e velocidade.
A conformidade dos objetos através de tempo e
espaço infindáveis a leis simples é, similarmente, algo que reclama uma
explicação em termos ainda mais simples. Consideremos, pois, o que isso quer
dizer. As leis não são coisas, independentemente de objetos materiais. Dizer
que todos os objetos se conformam a leis é simplesmente dizer que todos eles se
comportam exatamente do mesmo modo, que eles têm certos poderes que exercem
sobre outros objetos, e tendências a exercer esses poderes sob certas
circunstâncias. Dizer, por exemplo, que todos os fótons (as partículas da luz)
se movem a 300.000 km/s em relação a todos os enquadramentos inertes, é justo
dizer que cada fóton tem o poder de fazer isso e a tendência de sempre fazer
isso. Há, portanto, essa vasta coincidência dos poderes e tendências dos
objetos em todos os tempos e em todos os lugares. Essas leis permitem à física,
como mencionei, fornecer explicações relativamente simples dos fenômenos, mas
elas mesmas reclamam uma explicação em termos de algo bem mais simples. Se
todas as moedas de alguma região tem as mesmas marcas, ou se todos os papéis
[ou: artigos] em uma sala são escritos com a mesma caligrafia, buscamos uma
explicação em termos de uma fonte comum dessas coincidências. Devíamos buscar
uma explicação similar para essa vasta coincidência que descrevemos como a
conformidade dos objetos a leis da natureza – por exemplo, o fato de que todos
os elétrons são produzidos, atraem e repelem outras partículas e se combinam
com elas exatamente do mesmo modo a cada ponto dos infindáveis tempo e espaço.
A hipótese do teísmo é que o Universo existe porque
existe uma pessoa divina, que o mantém na existência e que as leis da natureza
operam porque existe uma pessoa divina que faz com que elas operem. Ele faz com
que as leis da natureza operem ao preservar em cada objeto sua tendência a
comportar-se de acordo com essas leis. Ele faz com que o Universo exista ao preservar
a cada momento (do tempo finito ou infinito) objetos com os poderes e
tendências codificados pelas leis da natureza, incluindo as leis da conservação
da matéria-energia, isto é, ao fazer que seja o caso a cada momento que aquilo
que existia antes continue a existir. A hipótese é uma hipótese de que uma
pessoa faz essas coisas ocorrerem por algum propósito. Ele age diretamente
sobre o Universo, como agimos diretamente sobre nossos cérebros, guiando-os a
moverem nossos braços (mas o Universo não é seu corpo – pois ele poderia a
qualquer momento destruí-lo, e agir num outro universo, ou passar [do] sem um
universo). Como vimos, a explicação pessoal e a explicação científica são os
dois modos que temos para explicar a ocorrência de fenômenos. Já que não pode
existir uma explicação científica para a existência do Universo, ou existe uma
explicação pessoal ou inexiste qualquer explicação. A hipótese de que existe
uma pessoa divina é a hipótese da existência do tipo mais simples de pessoa que
poderia existir. Uma pessoa é um ser que existe por algum tempo com o poder de
causar efeitos, o conhecimento de como fazer isso e a liberdade de fazer
escolhas em relação a quais efeitos causar. Uma pessoa divina é, por definição,
uma pessoa perpétua onipotente (isto é, infinitamente poderosa), onisciente
(isto é, tudo-sapiente), e perfeitamente livre; ele é uma pessoa perpétua de
infinito poder, conhecimento e liberdade, uma pessoa para cuja existência,
poder, conhecimento e liberdade não existem limites exceto aqueles da lógica. A
hipótese de que existe um ser com graus infinitos das qualidades essenciais
para um ser desse tipo é a postulação de um ser bastante simples. E é ainda
mais simples supor que essas propriedades não são acidentalmente
correlacionadas com cada uma outra, mas que se seguem necessariamente da
essência da pessoa divina. A hipótese de que existe uma tal pessoa divina é uma
hipótese muito mais simples do que a hipótese de que existe um Deus que tem um
poder limitado desse ou daquele modo. É mais simples, exatamente do mesmo modo
que a hipótese de que alguma partícula tem massa zero ou velocidade infinita é
mais simples do que a hipótese de que ela tem 0,32147 de alguma unidade [de
massa] ou uma velocidade de 221.000 km/s. Uma limitação finita reclama uma
explicação do porque existe justamente esse limite, de um modo que a não
limitação não reclama. Da perfeita liberdade de Deus segue-se que ele não
existirá sujeito a quaisquer influências que o impeçam de fazer o que ele vê
razão para fazer, isto é, aquilo que ele acredita ser bom fazer, e posto que
ele é onisciente, ele sempre saberá o que é bom, ele sempre fará o que é bom.
Ele será perfeitamente bom. Que deva existir qualquer coisa, sem mencionar um
universo tão complexo e ordenado como o nosso, é excessivamente estranho. Mas
se existe um Deus, não é vastamente improvável que ele deveria criar um
universo assim. Um universo como o nosso é uma bela coisa, e um teatro no qual
os humanos (e, por uma extensão limitada, outras criaturas) podem crescer e produzir
seu destino. A ordem do Universo o torna um belo Universo, mas, de modo ainda
mais importante, ela faz dele um Universo que os humanos podem aprendera
controlar e mudar. Um bom Deus desejará criar criaturas tais como seres humanos
possuindo uma livre escolha entre o bem e o mal, uma profunda responsabilidade
por si mesmos e um pelo outro e uma habilidade para formarem seu próprio
caráter de um modo tal a amarem a Deus, e para isso necessitamos de corpos,
lugares onde podemos interagir um com o outro e assim machucar ou beneficiar um
ao outro. Mas os seres humanos apenas podem cuidar de si mesmos e um do outro
(ou escolher não fazê-lo) se existem leis simples governando um universo no
qual os seres humanos estão corporificados. Se temos corpos, então existem
modos pelos quais podemos machucar ou beneficiar um ao outro. No entanto,
apenas se essas forem leis simples da natureza que podemos vir a aprender
haverá modos pelos quais isso ou aquilo que faço fará uma previsível diferença
para mim ou para você. Apenas se os humanos souberem que, semeando certas
sementes, removendo as ervas daninhas e aguando as sementes, eles colherão
milho, eles poderão desenvolver uma agricultura. E apenas se eles souberem que
atritando bastões eles podem fazer fogo eles poderão queimar os suprimentos
alimentares de outros. Leis apreensíveis da natureza permitem aos agentes uma
escolha sobre como tratar um ao outro. Assim, Deus tem uma boa razão para fazer
um universo ordenado e, ex hypothesi, sendo onipotente ele tem o poder para
fazê-lo. Assim, a hipótese de que existe um Deus torna a existência do Universo
muito mais esperada do que de outro modo seria, e essa é uma hipótese muito
simples. Daí que os argumentos da existência do Universo e de sua conformidade
com leis naturais simples sãobons argumentos para uma explicação dos fenômenos,
e fornecem evidência substancial para a existência de Deus.
O ultimo fenômeno que considerarei é a evolução dos
animais e humanos. Na metade do século XIX Darwin estabeleceu sua
impressionante teoria da evolução pela seleção natural para dar conta da
existência de animais e humanos. Uma vez existiram organismos primitivos. Esses
animais variaram de várias formas em relação a seus progenitores (alguns eram
mais altos, alguns mais baixos, alguns mais gordos, alguns mais magros, alguns
tinham princípios de asas, outros não tinham, e assim por diante). Esses
animais com características que os tornavam melhor adaptados para sobreviver
sobreviveram e passaram suas características para a próxima geração. Mas,
apesar de em geral se assemelharem aos seus progenitores, sua prole diferia
daquela deles, e as variações que melhor se adequavam à sobrevivência do animal
foram novamente aquelas mais prováveis de serem passadas para uma outra
geração.
Esse processo continuou por milhões de anos,
produzindo a inteira variedade de animais que temos hoje, cada qual adaptado a
sobreviver em um ambiente diferente. Entre as características que dão vantagem
em uma luta pela sobrevivência estava a inteligência, e as seleções para essa
característica eventualmente levaram à evolução dos humanos. Tal é o relato de
Darwin sobre porque hoje em dia temos os animais e os humanos.
Tão longe quanto ele alcança, esse relato
certamente é correto. Mas existem assuntos cruciais além do seu escopo. O
mecanismo evolucionário que Darwin descreve opera apenas porque existem certas
leis da bioquímica (os animais produzem muitas proles; essas variam de várias
formas em relação aos seus progenitores, etc.). Mas porque existem essas leis,
ao invés de outras leis? Sem dúvida porque essas leis seguem as leis básicas da
física. Mas, então, porque essas leis básicas da física têm uma forma tal de
modo a originar leis da evolução? E porque, em primeiro lugar, houve os
organismos primitivos? Uma estória plausível pode ser contada acerca de como a
“sopa primeva” de matéria-energia ao tempo do “Big Bang” (um momento cerca de
13.500 milhões de anos atrás, no qual, dizem-nos os cientistas agora, o
Universo, ou pelo menos o presente estágio do Universo, começou) originou, ao
longo de muitos milênios, de acordo com as leis físicas, aqueles organismos
primitivos. Mas então porque, em primeiro lugar, houve matéria adequada para um
tal desenvolvimento evolucionário? Com respeito às leis e com respeito à matéria
primeval, temos novamente a mesma escolha, de dizer que essas coisas não podem
ser melhor explicadas ou de postular uma explicação ulterior. O assunto aqui
não é porque existem quaisquer leis ou porque de algum modo existe matéria, mas
porque as leis e a matéria têm essa característica peculiar, que elas são
prontamente mobilizadas para produzir plantas, animais e humanos. Posto que são
as leis mais gerais da física que têm essa característica especial, não pode
haver explicação científica do porque elas são do modo que são. E embora possa
haver uma explicação científica de porque a matéria tinha ao tempo do Big Bang
a característica especial que ela tinha, em termos de sua característica em
algum tempo anterior, claramente, se houve um estado primeiro do Universo, ele
deve ter sido de um certo tipo: ou se o Universo tem durado sempre, (além de
ter o tipo certo de leis) sua matéria precisaria ter em todos os tempos certos
aspectos gerais (p.ex., a respeito da quantidade e diversidade de sua matéria
energia) se em algum tempo teria de haver um estado do Universo adequado para
produzir animais e humanos. As explicações científicas chegam a um ponto de
parada. Permanece a questão sobre se devemos aceitar essas aspectos
particulares das leis e da matéria do Universo como fatos brutos supremos ou se
devemos ir além deles até uma explicação pessoal em termos da atuação de Deus.
O que a escolha determina é o quão possível é que
as leis e condições iniciais deveriam ao acaso ter exatamente essa
característica. O trabalho científico recente chamou a atenção para o fato de
que o Universo é bem afinado. Dadas as leis do tipo atual (as quarto forças,
constrangidas pelos requisitos da Teoria Quântica), a matéria-energia ao tempo
do Big Bang tinha de ter uma certa densidade e uma certa velocidade de
recessão; um aumento ou diminuição com respeito a essas variáveis por uma parte
num milhão teria tido o efeito de que o Universo não seria fomentador de vida.
Por exemplo, se o Big Bang tivesse feito os quanta
de matéria-energia recuar um em relação outro um
pouco mais rapidamente, nenhuma galáxia, estrela ou planeta, e nenhum ambiente
adequado à vida, teria sido formado. Se a recessão tivesse sido marginalmente
mais lenta, o Universo teria colapsado sobre si mesmo antes que a vida pudesse
ter se formado. Similarmente, as constantes nas leis da natureza precisavam
repousar dentro de limites muito estreitos se a vida era para ser formada. Se
permitimos a possibilidade de leis de tipos diferentes daqueles que operam em
nosso universo, elas teriam de ser tipos muito especiais, não mais simples que
as atuais, se a vida – sem mencionar uma vida de tipo humano – tivesse de
evoluir, e assim novamente é a priori muito improvável que a vida sensiente
iria evoluir. É, portanto, muito improvável que as leis e condições iniciais
teriam tido por acaso um caráter produtor de vida. Alguns físicos atuais lhe dirão
que vivemos em um multiverso de modo que muitos diferentes universos possíveis
eventualmente virão a existir, e, assim, não é de surpreender que exista um
como o nosso. Mas, já que eles não podem observar esses outros universos, os
físicos só teriam algum fundamento para fazer essa alegação se a mais simples
teoria do nosso universo tivesse a conseqüência de que ele é governado por leis
da natureza que, de tempos em tempos, fazem brotar universos de tipos
diferentes. Assim, o próprio multiverso teria de ser governado por leis que, de
modo a alcançar esse “brotamento”, certamente teriam de ser consideravelmente
menos simples que as leis do nosso universo, e assim ainda menos provável de
ocorrer por acaso. E, assim, é muito improvável que devamos viver em um
multiverso que tem a característica de produzir em algum estágio um universo
como o nosso, quando muitíssimos possíveis multiversos (muitos dos quais
consistindo em apenas um universo e governado por leis mais simples que o
multiverso) não terá essa característica. A hipótese do multiverso não torna as
características do nosso universo nem um pouco mais improvável.
Deus é capaz de dar à matéria e às leis esse
caráter. Se podemos mostrar que ele teria razões para fazer isso, então isso dá
apoio à hipótese de que ele assim fez. Também se dispõe de uma razão (adicional
à razão de sua beleza) porque Deus teria, por algum motivo escolhido fazer
existir um Universo – o valor intrínseco dos seres corporificados sensientes
que o processo evolucionário faria existir, e acima de tudo dos humanos que
podem, por si próprios, tomar decisões informadas sobre que tipo de mundo
deveria existir.
Assim, os três argumentos que considerei – da
existência do Universo, de sua conformidade com as leis naturais e da
existência de humanos e animais – para a hipótese da existência de Deus são
todos eles argumentos que satisfazem bem os três critérios dados antes para os
argumentos indutivos para uma explicação. Os fenômenos citados pelas premissas
não são ordinariamente esperados, eles devem ser esperados se a causa postulada
na conclusão existe e a hipótese da existência dessa causa é simples cause. De
fato, sugiro que esses não são meramente bons argumentos a favor da existência
de Deus, mas que esses argumentos são bastante fortes. A pessoa divina
postulada é uma pessoa muito simples, e é grandemente improvável que os
fenômenos citados viessem a ocorrer por acaso – isto é, que deveria existir um
número tão grande de átomos no Universo, todos eles comportando-se exatamente
do mesmo modo que produz a vida humana.
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