sexta-feira, 24 de maio de 2013

O Emprego da Apologética

"Santificai a Cristo, como Senhor, em vossos corações, estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós, fazendo-o, todavia, com mansidão e temor..." (1 Pedro 3:15).

A palavra traduzida acima por "responder" é, no grego, apologia (isto é, "defesa"). Essa palavra sugere a idéia de "defesa da conduta ou procedimento". Wilbur Sinith expressa-o da seguinte maneira: "... uma defesa verbal, uma palavra de defesa daquilo que alguém fez ou da verdade que alguém crê...".

Apologia (palavra da qual surgiu em português a palavra apologia, que significa "discurso para justificar, defender ou louvar") foi uma palavra usada predominantemente no passado, "mas não para dar a idéia de pedido de desculpa, de tentativa de atenuar um erro ou de corrigir um prejuízo causado" , nem para elogiar.

O substantivo apologia (traduzido em português pelo verbo "responder" em 1 Pedro 3:15, acima citado) é empregado mais sete vezes no Novo Testamento:

Atos 22:1 "Irmãos e pais, ouvi agora a minha defesa perante vós."

Atos 25:16 "A eles respondi que não é costume dos romanos condenar quem quer que seja, sem que o acusado tenha presentes os seus acusados e possa defender-se da acusação."

1 Coríntios 9:3 "A minha defesa perante os que me interpelam é..."

2 Coríntios 7:11 "Porque, quanto cuidado não produziu isto mesmo em vós que segundo Deus fostes contristados! que defesa, que indignação, que temor, que saudades, que zelo, que vindita! em tudo destes prova de estardes inocentes neste assunto."

Filipenses 1:7 "... porque vos trago no coração, seja nas minhas algemas, seja na defesa e confirmação do evangelho, pois todos sois participantes da graça comigo."

Filipenses 1:16 "... estes, por amor, sabendo que estou incumbido da defesa do evangelho."

2 Timóteo 4:16 "Na minha primeira defesa ninguém foi a meu favor; antes, todos me abandonaram. Que isto não lhes sej a posto em conta."

A maneira como a palavra "responder" (isto é, "defender") é empregada em 1 Pedro 3:15 indica o tipo de defesa que alguém apresentaria perante um inquérito policial: "Por que você é cristão?" Um crente é responsável por dar uma resposta adequada a essa pergunta.

Paul Little cita John Stott como tendo dito: "Não podemos fomentar a arrogância intelectual de uma pessoa, mas devemos alimentar sua integridade intelectual" (E eu acrescentaria que devemos responder a perguntas feitas com sinceridade).

Beattie conclui que: "Ou o cristianismo é TUDO para a humanidade, ou então não é NADA. Ou é a maior das certezas ou a maior das desilusões. .. Mas se o cristianismo for TUDO para a humanidade, é importante que cada pessoa seja capaz de apresentar uma boa razão para a esperança que possui em relação às verdades eternas da fé cristã. Aceitar tais verdades sem ponderar a respeito, ou aceitá-las simplesmente por causa da autoridade que têm, não é suficiente para uma fé inteligente e estável."

A tese "apologética" fundamental destas anotações é: "Existe um Deus infinito, de sabedoria, poder e amor absolutos, que se revelou, por meios naturais e sobrenaturais, na criação, na natureza do homem, na história de Israel e da Igreja, nas páginas das Santas Escrituras, na sua encarnação em Cristo, e, através do evangelho, no coração daquele que crê."

Fonte:

Josh McDowell; "Evidências que exigem um veredito, vol. I"; ed. Candeia, pg.1-2.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Livro: "A Caixa Preta de Darwin" de Michael Behe

Há exatamente dez anos atrás Michael J. Behe, até então um desconhecido professor de Bioquímica da Universidade Lehigh, na Pensilvânia, Estados Unidos, escreveu o livro “A Caixa Preta de Darwin: O Desafio da Bioquímica à Teoria da Evolução”. A tese polêmica e controversa de Behe: a ‘complexidade irredutível’ de sistemas biológicos não pode ser obtida via processo gradual darwiniano.

O flagelo bacteriano se tornou o mascote do movimento do Design Inteligente e a grande dor de cabeça e um sério desafio epistêmico para a Nomenklatura científica desde então. Nem os maiores cientistas, nem todas as universidades, departamentos e institutos de biologia do mundo conseguiram refutar a tese de Behe.

NOTA BENE: NEM OS MAIORES CIENTISTAS, NEM TODAS AS UNIVERSIDADES, DEPARTAMENTOS E INSTITUTOS DE BIOLOGIA DO MUNDO CONSEGUIRAM REFUTAR A TESE DE BEHE.

O pior embaraço nisso tudo é que o flagelo é de uma ‘simples’ bactéria, mas a teoria é noticiada exagerada e acriticamente na Grande Mídia internacional e tupiniquim como sendo ‘a mais apoiada de todas as teorias científicas pelas evidências assim como a lei da gravidade’, mas aqui se mostra extremamente impotente e muda...

Nada como celebrar uma vitória contra a arrogância epistêmica dos atuais mandarins da Nomenklatura científica. Behe acabou de lançar a edição comemorativa dos dez anos da solidez de sua tese: “Darwin’s Black Box, 10th Anniversary Edition”. Vale a pena comprar o livro só para ler um epílogo de 18 páginas!

Alô Jorge Zahar Editor – já está na hora de lançar aqui no Brasil esta edição comemorativa. Mercado existe.

Behe afirma – “Hoje, com as denúncias frescas sendo feitas quase que semanalmente por sociedades científicas bem como das salas de editorias de jornais” do establishment da mídia científica, “uma década após a publicação do A Caixa Preta de Darwin, o argumento científico a favor do design é mais forte do que nunca... o argumento do livro a favor do design permanece”.
Apesar do enorme progresso da bioquímica nos anos que se seguiram, apesar de centenas de comentários inquiridores em periódicos tão diversos como The New York Time, Nature, Christianity Today, Philosophy of Science e Chronicle of Higher Education, apesar da implacável oposição de alguns cientistas nos mais altos níveis, o argumento do livro a favor do design permanece.

Fora atualizar a lista de nomes dos meus filhos na seção de reconhecimento (adicionados Dominic, Helen, e Gerard), há pouco do texto original que eu mudaria se o escrevesse hoje”. BEHE, M. J., "Darwin's Black Box: The Biochemical Challenge to Evolution," [1996], New York, Free Press, 2006, p.255.

O mais impressionante de tudo isso, conforme Behe bem salientou é que “para a ciência moderna, dez anos é uma era”, e a década dos anos 1990s não foi nenhuma exceção, especialmente com o progresso rápido do “progresso no entendimento de como a maquinaria da vida funciona” incluindo “o cílio e o flagelo” usados por Behe como exemplos de complexidade irredutível. Além disso, “os mecanismos que as células usam para construir” são hoje “conhecidos como sendo sistemas moleculares surpreendentemente sofisticados, como fábricas automatizadas que produzem motores de popa”.

QED – “o caso a favor do design inteligente da vida se torna exponencialmente mais forte”.
A bioquímica avançou muito, e um pouco mais de uma década a primeira seqüência genômica de um ser vivo foi publicada – uma minúscula bactéria chamada Haemophilus influenzae. Hoje nós temos centenas de genomas seqüenciados, e o progresso na elucidação genômica tem sido acompanhado do entendimento de como a maquinaria da vida funciona. Os mecanismos que as células usam para construir o cílio e o flagelo descritos no capítulo 4 eram quase que totalmente desconhecidos quando o livro foi escrito.

Hoje eles são conhecidos como sendo impressionantemente sofisticados sistemas moleculares em si mesmos. Resumindo, como a ciência avança implacavelmente, o fundamento molecular da vida não está ficando um pouco menos complexo do que há uma década atrás; está ficando exponencialmente mais complexo. À “medida que fica, o caso a favor do design inteligente da vida fica exponencialmente mais forte”, Behe, 2006, p. 256.

Quase no final do seu epílogo Behe destaca:
“As probabilidades futuras de êxito do design são excelentes, porque elas se apóiam não em preferências de nenhuma pessoa ou de nenhum grupo, mas em dados. A ascensão da hipótese do design inteligente não é devido a nada que eu ou qualquer outro indivíduo tenha escrito ou dito, mas ao grande avanço da ciência em entender a vida. Mesmo apenas cinqüenta anos atrás era bem mais fácil acreditar que a evolução darwiniana pudesse explicar a base da vida, porque tão pouco era conhecido.

Mas assim que a ciência avançou rapidamente e a complexidade impressionante da célula se tornou nítida, a idéia de design inteligente se tornou mais e mais convincente. A conclusão do design inteligente é fortalecida por cada novo exemplo de maquinaria molecular elegante e complexa ou sistema que a ciência descobre na base da vida. Em 1966, aquela elegância podia ser claramente vista, e nos últimos dez anos tem aumentado consideravelmente. Não há razão de esperar que isso venha diminuir brevemente”. (Behe, 2006, p. 270).

Pobre Darwin… a sua teoria geral da evolução é hoje meramente um mito de criação do naturalismo filosófico travestido de ciência...


Pobre ciência, no cativeiro do naturalismo filosófico...

terça-feira, 21 de maio de 2013

O desespero incessante da vida sem Deus

Por Wagner Kaba

Muitos ateus se comprazem em afirmar que os crentes são pessoas iludidas pela idéia da existência de Deus. Muitos discordarão desta alegação, inclusive o autor deste artigo. Mas este texto não tem como foco analisar a suposta ilusão daqueles que crêem e sim, analisar uma ilusão freqüente compartilhada por muitos daqueles que não crêem: a idéia de que Deus é irrelevante para a questão do sentido da vida. Será que se pode declarar a morte de Deus e, mesmo assim, alegremente afirmar que a vida possui sentido?

Os cientistas afirmam que o universo está fadado a morrer. Como ele está em expansão desde o Big Bang, tudo que nele existe está se tornando cada vez mais distante. Com o passar do tempo, as estrelas perderão seu calor e irão morrer. Deste modo, o universo se tornará cada vez mais frio, e sua energia irá se esgotar. O espaço ficará repleto de cadáveres estelares que serão tragados por buracos negros. E até mesmo os buracos negros serão consumidos e irão se evaporar. Assim, todas as coisas estão condenadas a desaparecer sob os escombros de um mundo agonizante. Tudo o que foi construído pelo homem desaparecerá sem deixar nenhum vestígio. Não haverá nenhum ser vivo para contar alguma história e nenhum outro para ouvi-la. “Tudo aquilo que já formou você, as montanhas, as estrelas e tudo o mais será uma coisa só: um mar escuro de energia. Um mar cada vez mais frio, inerte. Sem nada nem ninguém para acender a luz.” [1]

Neste cenário, faz alguma diferença fundamental o fato de o universo algum dia ter existido? Quer o universo tenha surgido ou não, no final das contas o resultado é o mesmo: um vazio negro, frio e inerte. Assim, como tudo acaba em nada, não faz diferença nenhuma se algo existiu ou não. Portanto, o universo não tem um sentido fundamental[2].

Este mesmo raciocínio pode ser aplicado ao ser humano. Se Deus não existe, o homem está condenado a desaparecer como se nunca houvesse existido. Deste modo, no final das contas, não fará diferença nenhuma o fato de algum homem ter surgido sobre a face da terra. A humanidade, portanto, não tem mais importância do que um enxame de mosquitos ou uma vara de porcos, pois seu fim é o mesmo. O mesmo processo cósmico cego e mecânico que a vomitou no início um dia acabará por engoli-la[3].

No final, todos os esforços humanos terão sido em vão. A contribuição dos cientistas para o avanço da ciência, os esforços dos pacifistas para promover a paz, as pesquisas médicas para descobrir a cura de doenças, o trabalho dos humanitaristas para erradicar a pobreza – no final, tudo o que custou tanto para ser conquistado, muitas vezes à custa de inúmeras vidas, desaparecerá como se nenhum esforço houvesse sido realizado. Desta forma, tudo acaba em nada e, portanto, o homem é nada.

O filósofo William Lane Craig apresenta o quadro em que estamos inseridos:
“Se cada pessoa deixa de existir quando morre, que sentido fundamental pode ser dado à sua vida? Realmente faz diferença se ela existiu? Pode ser dito que sua vida foi importante porque influenciou outros ou afetou o curso da história. Mas isso mostra apenas um significado relativo da sua vida, não um sentido fundamental. Sua vida pode ter importância relativa a certos acontecimentos, mas qual é o sentido fundamental desses acontecimentos? Se todos os acontecimentos não têm sentido, então que sentido fundamental pode haver em influenciá-los? No final das contas, não faz diferença.”[4]

Mesmo assim, muitos ateus insistem em dizer que a vida possui propósito. “A vida não vem com um manual de instruções indicando seu sentido”, dizem eles. “Somos nós que o criamos. E é isto o que faz a vida tão maravilhosa. Podemos escolher o que queremos, que sentido e que rumo queremos dar a ela.”

Inventar um sentido para a vida pode até ajudar uma pessoa a se sentir bem. Mas esta invenção não passa de um auto-engano para ajudar a suportar a dura realidade da existência, visto que a vida continua sem sentido em termos objetivos do mesmo jeito.

Se Deus não existe, o que é o homem? Ele é apenas um subproduto acidental da natureza que evoluiu recentemente em um ponto de poeira infinitesimal perdido em algum lugar de um universo hostil e sem sentido e que está condenado a perecer individualmente e coletivamente em um espaço relativamente curto de tempo[5]. Nesta ordem de idéias, homem é mero produto do acaso e não há propósito nenhum em sua existência. E nenhuma tentativa de se inventar um sentido para a existência poderá mudar estes fatos. Portanto, inventar um sentido para sua vida não passa de um exercício de auto-engano.

Além de tudo, o universo não adquire sentido apenas porque alguém lhe atribui algum. Suponha que duas pessoas dêem sentidos diferentes ao universo. Quem tem razão? A resposta, é claro, nenhuma das duas. O mundo sem Deus permanece sem sentido em termos objetivos, não importa o que as pessoas pensem. Assim, atribuir um sentido ao universo não passa de um exercício de auto-engano[6].

Mas por que esta discussão sobre o sentido da vida é tão importante? A resposta é que, para ser feliz, o homem necessita de um sentido para sua existência. Por quê? Porque o homem se alimenta de auto-estima. Uma auto-estima baixa pode levar facilmente à depressão e ao suicídio. E dificilmente alguém pode manter elevada sua auto-estima se descobrir que sua vida não tem nenhum propósito.

Assim sendo, se Deus não existe, a vida não tem sentido. E se a vida não tem sentido, o homem que possui consciência desta verdade terá uma séria dificuldade para ser feliz. Portanto, a existência de um Deus amoroso é uma peça importante para a construção da felicidade.

A única solução que um ateu pode oferecer diante do absurdo da vida sem Deus é enfrentar este absurdo e procurar viver com coragem. O filósofo ateu Bertrand Russell, por exemplo, sugeriu que devemos construir nossas vidas “sob o firme fundamento do desespero incessante”:
“Que o homem é o produto de causas que não possuíam conhecimento do fim que estavam alcançando; que sua origem, seu crescimento, suas esperanças e crenças, seus amores e temores, não passam do resultado de colisões acidentais de átomos; que nenhum fogo, nenhum heroísmo e nenhuma intensidade de pensamentos e emoções podem preservar uma vida além do túmulo; que todo labor de todas as eras, todas as devoções, toda inspiração, todo brilhantismo do gênio humano estão fadados à destruição na grande morte do sistema solar e que todo o templo das conquistas humanas deve ser inevitavelmente soterrado debaixo dos escombros de um universo em ruínas – todas estas coisas, se não estão além das controvérsias, são quase tão certas que nenhuma filosofia que as rejeite pode ter esperanças de se sustentar. Somente sobre a base destas verdades, somente sobre o firme fundamento do desespero incessante, pode-se construir seguramente, de agora em diante, a habitação da alma.”[7]

Na hipótese de que o ateísmo seja verdadeiro, estamos diante deste quadro terrível sobre a condição humana. Mas se o Cristianismo é verdadeiro, então existe um poder de amor por trás do universo. Um poder pessoal de amor tão grande que todos os homens e mulheres, velhos e crianças são especiais para ele. Ele ama tanto o ser humano que há um significado em cada vida. Ele realmente sabe sobre a queda de todos os pardais e, até mesmo, os cabelos de cada pessoa estão contados.

Por derradeiro, este texto não realizou nenhum esforço para demonstrar a existência de um Criador Divino. Também não houve nenhuma tentativa para se refutar a idéia de que a crença no sobrenatural é uma ilusão. Para se atingir estes objetivos seria necessário um espaço muito maior. Por isso, o propósito deste artigo foi simplesmente o de enunciar as alternativas de forma clara. Se Deus não existe, a vida é um absurdo e o homem deve construir sua existência sobre o “firme fundamento do desespero incessante”, conforme palavras do filósofo ateu Bertrand Russell. Se o Deus cristão existe, todas as pessoas são especiais para ele e possuem valor e significado.

É possível demonstrar racionalmente que o cristianismo é uma cosmovisão mais plausível do que o ateísmo[8]. No entanto, mesmo que as evidências para o ateísmo e para o cristianismo fossem equivalentes, uma pessoa racional deveria escolher o último. Todo ser humano deve buscar a verdade e evitar o erro. Mas, se as evidências que suportam as duas cosmovisões são ambíguas, não parece sensato preferir o desespero e a ausência de sentido do que uma vida com propósitos.

Referências:
[1] NOGUEIRA, Salvador. Para onde vamos? Disponível em < http://super.abril.com.br/…/2…/materia_revista_261312.shtml…>. Acesso em 03 de Agosto de 2008.
[2]CRAIG, William Lane. A veracidade da fé cristã: uma apologética contemporânea. Tradução Hans Udo Fuchs. São Paulo: Vida Nova, 2004. P. 59.
[3] Ibidem, p. 59.
[4] Ibidem, p. 58.
[5] Idem, A imprescindibilidade de bases meta-éticas teológicas para a moralidade. Disponível em <http://www.apologia.com.br/?p=9>. Acesso em 03 de Agosto de 2008.
[6] Idem, op. cit., p. 64,65.
[7]RUSSELL, Bertrand. A free man´s worship. Disponível em < http://awayward.com/…/Russell,%20Bertrand%20-%20A%20Free%20…>. Acesso em 02de Agosto de 2008.
[8] A pessoa que desejar analisar as evidências em favor da verdade do Cristianismo pode estudar os seguintes livros: CRAIG, William Lane. A veracidade da fé cristã: uma apologética contemporânea. São Paulo: Vida Nova, 2004; GEISLER, Norman; TUREK, Frank. Não tenho fé suficiente para ser ateu. São Paulo: Editora Vida, 2006; STROBEL, Lee. Em defesa de Cristo. São Paulo: Editora Vida, 2001; Idem, Em defesa da fé. São Paulo: Editora Vida, 2002. Pode-se estudar também os artigos disponíveis no blog Apologia <http://www.apologia.com.br>.

Fonte:

terça-feira, 14 de maio de 2013

Francis Schaeffer: A Fé dos Humanistas


Duas Colunas
Duas colunas distinguiam a Igreja cristã primitiva de qualquer outro sistema religioso. A primeira dizia respeito ao fundamental problema da autoridade. Em tal Igreja só existia uma autoridade final: a Bíblia, a Sagrada Escritura. Isto se depreende claramente dos ensinamentos de Jesus, de Paulo e da totalidade do Novo Testamento. Entre os leitores do presente tratado, muitos crerão que a Igreja primitiva estava certa em sustentar este conceito da Escritura; porém, até mesmo aqueles que não o aceitam, deveriam compreender que tal foi o conceito da Igreja, para assim entender intelectualmente a mesma.

Os primeiros cristãos criam que a Sagrada Escritura lhes dava uma autoridade externa ao âmbito do relativista, mutável e limitado pensamento humano. Assim, com esta visão da Palavra, tinham o que consideravam uma autoridade não humanista.

A outra coluna da Igreja primitiva que a diferenciava de todos os demais sistemas religiosos era sua resposta à pergunta: Como se achegar a Deus? Se Deus existe e é santo, perfeitamente santo, vivemos num universo moral. Se Deus não existe ou se é amoral ou imperfeito, vivemos, consequentemente, num universo relativo com relação à moral. Por outro lado, se Deus é perfeito, e mantém sua total perfeição, então, como é óbvio que nenhum homem é moralmente perfeito, todos eles estarão condenados. A única coisa que poderia resolver este dilema, verdadeiramente básico, acerca de se o universo é moral ou amoral, seria o ensinamento da Bíblia e da Igreja primitiva. Tal ensinamento foi que Deus nunca diminuiu o nível de Suas normas, que Ele exige perfeição e que, portanto, Ele é completamente moral; e que, porém, por causa do amor de Deus, veio Jesus Cristo como Salvador, e realizou uma obra infinita e definitiva na cruz, de maneira que o homem já pode se achegar ao Deus totalmente santo e perfeito, apoiado nesta obra perfeita e consumada, pela fé e sem obras humanas relativas. Estamos tão acostumados a falar disto dentro de um contexto religioso, que esquecemos das implicações intelectuais. Diremos de novo que, tanto se se crê no que a Igreja primitiva e a Bíblia ensinaram, como se não se crê, deve-se entender este ponto que estamos tratando, ou não se poderá compreender a tal Igreja, nem seu caráter distintivo.

Uma vez que se ensina a exigência por parte de Deus de perfeição total, se mantém a existência de um universo moral; e ao se ensinar a obra perfeita do Salvador, segue-se que não necessariamente todos os homens sejam condenados. Assim, qualquer elemento humanista e egoísta é destruído. Até mesmo se o cristianismo não fosse verdade, e nós cremos que ele o seja, esta seria uma resposta titânica; jamais nenhum outro sistema — seja religioso, seja filosófico — deu semelhante resposta.

Assim, pois, as duas colunas distintivas da Igreja primitiva eram um golpe combinado e completo contra o humanismo. A autoridade ficava fora da mutável jurisdição humana e assim, o acesso pessoal de cada indivíduo ao Deus eternamente santo se baseava, não nos atos morais ou religiosos relativos do homem, mas na absoluta e definitiva obra (e por ser Ele Deus, infinita) de Jesus Cristo. Tudo isto fazia que o homem fosse arrancado do centro do universo, donde havia intentado situar a si mesmo, quando se rebelou contra Deus na histórica queda no Éden, e destruía o humanismo, atacando-lhe no seu próprio coração.

Uma mudança
Uma mudança apareceu nos tempo do imperador Constantino. Este fez paz com a Igreja, porém, começou a se intrometer nela. Esta mudança de direção progrediu lentamente no princípio, e logo com crescente velocidade. Tendo começado com Constantino, foi orientada em sua direção definitiva na época de Gregório o Grande; e não com respeito a questões incidentais, mas ao conceito básico. Tal mudança de direção destruiu as duas únicas colunas, as quais referimos mais acima. A Igreja viria a ser o centro da autoridade, no lugar da Palavra de Deus. Aqui é re-introduzido o elemento humanista. Com relação à segunda coluna, é agora afirmado que a salvação, em vez de descansar somente sobre a completa obra de Cristo — isto é, sua obra consumada no espaço e no tempo, na história — se sustenta também nas obras humanas. No sistema católico-romano, estas obras se acham em três importantes âmbitos. O primeiro é o da missa. Não se considera já, na missa católico-romana, que Jesus Cristo consumou Sua obra no espaço de tempo histórico em que morreu na cruz, mas que Jesus Cristo está sofrendo constantemente. Ele sofre de novo, no sacrifício não sangrento, cada vez que se celebra uma missa. Porém há mais ainda: considera-se que aqueles que participam da missa estão oferecendo a Cristo em sentido ativo. Basta ler o missal católico-romano para dar-se conta da força disto. Cristo é oferecido pelo oficiante, porém quem participa da missa participa em seu oferecimento ativo de Cristo.

Achamos o segundo elemento humanista no âmbito da penitência. Esta é o sofrimento na vida atual, seja religioso, seja de uma maneira geral, para compensar a ausência de boas obras positivas. Assim, o sofrimento tem valor prático.

O terceiro elemento humanista diz respeito ao âmbito do purgatório, no qual o valor do sofrimento se projeta para o futuro. Sofre-se até merecer o mérito de Cristo.

Claro está, que desta maneira se destroem totalmente as duas colunas básicas da Igreja primitiva, e assim encontramos no sistema católico-romano um retorno ao que está especificamente relacionado com os demais sistemas humanistas.

Os críticos da arte
Os críticos da arte, literatura, etc., entendem estas coisas e as expõem com notável clareza. Numa publicação de Skira sobre Botticelli, Giulio Carlo Argan, italiano, crítico de arte, escreve: “O fato é que, certamente, nos planos políticos e religiosos havia um grande futuro para este sincretismo da arte e da cultura, uma vez que aquele havia sido incorporado ao programa humanista progressivamente estabelecido pela Igreja depois do sério Cisma do Ocidente (1378-1417), já que esse programa facilitava, no final das contas, numa justificação histórica da fé cristã, admitindo a Antiguidade clássica como sua e mostrando-a arrogantemente como a filosofia natural do homem, o prelúdio providencial à revelação da verdade absoluta por Jesus Cristo. Porém esta grandiosa, sistemática síntese de história, natureza e fé, que iria constituir a base ideológica do classicismo de Rafael...” No exposto, Argon resume e explica o humanismo básico da Igreja Católica Romana.

Notem-se três coisas:
I. — Ele diz que se trata de um programa humanista.
II.— Diz que a justificação histórica da fé cristã — justificação ante aqueles que representam a cultura humanista em volta, ante os homens que estão fora da Igreja —, foi proporcionada por uma síntese sistemática.
III.— Destaca que com esta síntese, traça-se uma linha ininterrupta entre a Antiguidade e a verdade revelada em Jesus Cristo.

Tudo está escrito, certamente, numa História de Arte, e desde o ponto de vista da arte; porém, o que disse o autor é verdade de modo geral. O catolicismo romano constitui um intento de síntese entre as noções humanistas em volta e as não humanistas da Escritura.

A pintura do Renascentismo deixa isto sumamente claro. Rafael planejava pintar quatro habitações no Vaticano. Pintou duas, e seus discípulos as outras duas. Um das habitações pintadas pelo próprio Rafael, nos proporciona uma claríssima prova do que descreve Argan como “a base ideológica do classicismo de Rafael”. Numa parede desta habitação pintou a Igreja, tal como a via em sua forma católico-romana, e na oposta, “A Escola de Atenas”. Isto não foi por casualidade, já que o fez assim de propósito. Trata-se de uma expressão artística do intento católico-romano de síntese entre a filosofia humanista, e a não humanista da Palavra de Deus.
No tempo em que Rafael trabalhava no Vaticano, Miguel Ângelo pintava a Capela Sixtina. Devem-se considerar os aspectos de sua obra na mesma. Primeiro, as pinturas do teto; logo, as da parede do fundo.

No abobadado teto pintou uma séria de figuras colocadas de uma forma que dava a impressão de sustentar a seção central do mesmo. Estas figuras correspondem alternativamente a um homem e uma mulher. Colocou o nome correspondente debaixo de todas elas, de modo que não pode haver equívoco com relação ao que estava dizendo. Os homens representam os profetas do Antigo Testamento. As mulheres, as antigas sibilas. Colocou a todos alternativamente como iguais. Eis aqui sua maneira de dizer o que dizia Rafael com suas pinturas do Vaticano. Na abóbada assim sustentada, achamos a representação pictórica do cristianismo.
Assim, Miguel Ângelo entende e expõe claramente como em seu tempo a Igreja Católica Romana se esforçava para realizar a síntese entre o antigo humanismo e o cristianismo bíblico.
A pintura da parede do fundo da Sixtina nos diz a mesma coisa. Representa o Juízo Final, e quando se contempla pela primeira vez, pensa-se que, exceto pelo lugar central de Maria, é uma cena bíblica. Porém, logo se observa a existência de um pequeno barco na parte inferior direita, e se adverte que nos achamos diante do barco no qual os mortos eram conduzidos através da lagoa Estigia, segundo a mitologia pagã. A pessoa então, se dá conta que a cena não procede da Bíblia, mas de Dante, que já trabalho sobre a base da mencionada síntese.

O teólogo mais importante
O teólogo mais importante da Igreja Católica Romana é Tomás de Aquino. A leitura de sua Summa manifesta claramente a ênfase na mencionada síntese. Assim, o que vimos dizendo não é desconhecido na apresentação da própria Igreja Católica Romana. Tanto em sua arte, como em sua teologia, o catolicismo romano está edificado específica e centralmente sobre o intento de síntese entre os pensamentos humanista e bíblico.

Este elemento humanista do catolicismo romano explica o desenvolvimento da mariologia. Maria representa o mesmo. Tu, homem, individualmente não alcanças a vitória porém, Maria, sim, Maria, venceu. E, deste modo, temos um triunfo vicário do homem. Do mesmo modo, os santos católico-romanos representam também uma humanidade vicária, vitoriosa. O homem triunfou.

Seguindo a atual ênfase comum, que intenta apagar as diferenças entre as diversas religiões, se diz frequentemente, inclusive por evangélicos, porém afetados por esta tendência, que o catolicismo romano adora ao menos, com toda segurança, ao mesmo Deus que a Igreja primitiva e a Reforma. Desgraçadamente, a resposta é: não. O catolicismo romano não adora ao mesmo Deus. A entrada do elemento humanista no sistema católico fez com que Deus seja considerado como um Deus distinto do apresentado na Bíblia. O Deus bíblico é inteiramente santo. Ele não pode aceitar nem a menor imperfeição moral. Se o Deus totalmente santo quiser tratar com algum homem, depois da rebelião deste, sobre qualquer elemento da obra moral humana, só poderia condená-lo. Por isso, no sistema bíblico, Deus permanece inteiramente santo, e nós vivemos num universo absolutamente moral. No sistema católico-romano, Deus não é totalmente santo, já que aceita a imperfeição. Tal sistema afirma que somos salvos pelo mérito de Jesus Cristo, porém introduzindo o elemento humanista, porque o homem deve merecer o mérito de Jesus Cristo. A saída definitiva do purgatório se baseia no merecimento. Este se obtém: 1) Pelas boas obras nesta vida, tanto religiosas como morais; 2) pelo valor dos sofrimentos experimentados na vida presente, que compensam o que faltou com relação às boas obras; 3) pelo valor do sofrimento que se experimenta no purgatório, o qual compensa o que faltou nos sofrimentos da vida na terra. Quando se tem alcançado isto, o mérito de Cristo é merecido. Tudo isso significa que o homem triunfou. Porém, quer dizer também que se adora a um Deus que não é completamente santo. Desde o ponto de vista bíblico tudo isso é, naturalmente, trágico; porém, para alcançar uma compreensão intelectual disso, deve-se entender também que significa que o cristianismo bíblico conduz finalmente, na realidade, a um Deus humanista, não absoluto. Com pesar, porém com uma finalidade definida, deve-se entender e afirmar que o Deus do sistema católico-romano não é o da Sagrada Escritura. Esse Deus é imperfeito; e o universo não é, portanto, absolutamente moral.

Nada novo
A Reforma não reconheceu nem ensinou nada novo. Isto é, nada novo em referência ao ensinamento da Igreja primitiva. A Reforma voltou simplesmente às duas colunas básicas a que nos referimos mais acima. A Palavra de Deus era a única autoridade, e a salvação tinha como base única a obra definitiva do Senhor Jesus Cristo, consumada na cruz. Tudo isso significava a remoção dos elementos humanistas. A Reforma foi revolucionária porque se apartou tanto do humanismo católico-romano, como do secular.
Para entender o que sucedeu depois, deve-se ter em conta que, há uns 250 anos atrás, o humanismo tinha se introduzido na Alemanha, e desta vez nas igrejas que haviam surgido da própria Reforma. Isto foi o nascimento do que na atualidade se chama usualmente liberalismo ou modernismo protestante. A alta crítica alemã e tudo quanto brotou dela até nossa geração, é simplesmente a entrada do pensamento humanista na Igreja protestante depois da Reforma, exatamente como, desde a época de Constantino em diante, o humanismo entrou na corrente da Igreja primitiva. Nunca se enfatizará suficientemente que a alta crítica não sobreveio porque certos fatos a fizeram necessária, mas porque a filosofia humanista sobreveio primeiro. Aceitou-se em primeiro lugar a filosofia humanista, e logo foram adicionados “fatos” que pareciam poder prover uma base conforme a perspectiva humanista. A alta crítica não foi a causa, mas o resultado. Os teólogos protestantes de tal época permitiram a entrada do conceito humanista na Igreja protestante. As duas colunas básicas não humanistas da Igreja foram destruídas de novo. O que devemos entender agora é que, na nossa própria geração, tanto o humanismo do sistema católico-romano como o do protestantismo liberal não diminui, mas que é cada vez mais forte em ambos.

Talvez a maior revolução
Talvez a maior revolução de nossa geração seja a mudança acontecida no catolicismo romano. Alguns podem dizer que na realidade não houve mudança, e que tudo isso é somente um estratagema; porém, seria difícil estar completamente seguro de se efetivamente é esse o caso. O aumento do humanismo na Igreja Católica Romana, em nossa geração, se mostra nos dois âmbitos.

Em primeiro lugar, é um fato que até mui poucos anos atrás Roma havia insistido que os três primeiros capítulos de Gênesis deveriam ser interpretados literalmente. Hoje em dia, quando os científicos católico-romanos se reúnem com os seculares, isto é deixado de lado. Estes homens da ciência romano-católicos não são seculares, mas membros das diversas ordens religiosas. Afirmam-se, nos círculos católico-romanos liberais atuais, que tudo o que devemos aprender do três capítulos do Gênesis é que, no processo evolutivo de animal a homem, a única coisa que se necessitou é que Deus introduzisse em certo momento uma alma racional. Isto é totalmente revolucionário em relação ao que Roma havia ensinado ainda em nossa própria geração, e significa um fortalecimento definido do humanismo.

Em segundo lugar, Roma mudou radicalmente na questão de quem se salva. No passado, o catolicismo romano ensinava, como todavia o faz na Espanha ou no Sul da Itália, por exemplo, que não havia salvação possível fora da Igreja Católica Romana. Hoje em dia, a ênfase recai em que todos os homens sinceros, e de boa vontade, são salvos. Na Igreja primitiva e na Reforma se enfatizou o ensinamento bíblico de que quem não estivesse na Igreja de Cristo (quem não tivesse tomado a Jesus Cristo como Salvador) estaria condenado. Segundo o antigo sistema católico-romano, aqueles que permaneciam fora da organização da Igreja Católica Romana estavam perdidos. Em ambos os casos, nos encontramos com o fato de que havia alguém que estaria perdido. No novo ensinamento católico-romano, com seu acrescentado humanismo, é muito difícil saber quem está perdido; e com respeito aos círculos católico-romanos mais pronunciadamente liberais, não se pode estar seguro se alguém se perde.

Assim, nos achamos ante o velho humanismo, que começou na época de Constantino, da Igreja Católica Romana, porém aumentado agora com o humanismo do moderno catolicismo-romano. Deve-se notar, por conseguinte, que o novo conceito liberal católico-romano não constitui um rompimento absoluto com o antigo catolicismo romano, já que este mesmo tem sido sempre humanista. Constitui simplesmente uma confluência das diversas correntes de um mesmo canal. Deve-se notar, também, que um homem como Teilhard de Chardin, tão popular na Europa e América, corresponde exatamente a esta circunstância.

Ao mesmo tempo
Ao mesmo tempo, o protestantismo humanista, que se iniciou com a erupção da alta crítica alemã, está se movendo, por sua parte, cada vez mais na mesma direção. Existe um notável paralelo entre o que sucede no campo liberal católico-romano, e o que se passa no protestantismo. Assim como o antigo catolicismo romano humanista está se transformando no humanismo ainda mais aberto do catolicismo romano liberal, também o antigo protestantismo liberal está desenvolvendo um novo liberalismo. Desde a aparição da teologia kierkegaardiana, isto é, a chamada neo-ortodoxia, se utiliza mais a palavra “Deus”, assim como outros termos religiosos, porém significa menos. No velho protestantismo liberal, as coisas eram, ao menos, certas ou falsas — no espaço, tempo e história —, de um modo que qualquer um poderia entender. No novo protestantismo liberal, a imprecisão que se pode notar nas obras de Teilhard de Charlin, é igualmente aparente. As afirmações do bispo Pike, da Califórnia, devem ser entendidas neste contexto teológico. Ele tem levado simplesmente o novo liberalismo de Kierkegaard, Barth, Brunner e Niebuhr a suas conclusões lógicas, porém falando numa linguagem clara, isenta de termos técnicos, de maneira que a força completa do lendário novo mundo religioso do liberalismo pode ser percebida pelo não especialista. Bultmann e Tillich têm feito o mesmo, conduzindo o pensamento de Kierkegaard a suas conclusões lógicas; e no caso de Tillich, parece provável que ele tenha ido mais longe do que Pike, porém suas obras estão escritas com uma terminologia tão elevada, que somente os que entendem podem dar-se conta da força do que foi escrito. Em todos os casos, a palavra “Deus” veio significando cada vez menos, até ao extremo de que uma pessoa deve se perguntar assombrada se nessa teologia há algum Deus. Esta é exatamente a direção que segue o catolicismo romano humanista em sua nova forma liberal, mostrada por Tielhard de Chardin. Devemos afirmar novamente, desta vez referindo-nos ao protestantismo liberal, que seu Deus não é o bíblico.

No pensamento oriental, a “justificação da vida” é a meditação. Isto não significa que meditando se encontre algo necessariamente, mas que a meditação como tal, dá à vida humana um aparente propósito e significado. No novo liberalismo se encontra a fé, desde Kierkegaard, como um passo nas trevas, como a justificação da vida. Isto está mais em consonância com a mente ocidental que a meditação, porque o passo nas trevas incumbe à ação e, portanto, à vontade de sofrer pela própria ação. Porém, basicamente é o mesmo: o passo nas trevas traz a justificação da vida, e a terminologia religiosa vem sempre sendo usada cada vez mais para que pareça dar um propósito à vida. Porém, nunca se está seguro se nela há realmente algum significado, e a própria palavra “Deus” se torna mais e mais vaga, até desaparecer até mesmo a distinção entre um Deus pessoal ou impessoal. Neste ponto, o catolicismo romano e o protestantismo liberal humanista, ambos em sua nova forma, estão perto de se unirem; e em termos de humanismo, ambos estão relacionados com o conceito clássico grego de ideias e ideais, assim como com os conceitos orientais.

É significativo
É significativo que “O fenômeno do homem”, obra de Teilhard de Chardin, publicada depois de sua morte, mostre a marca desta união. Teilhard de Chardin era jesuíta. Julian Huxley, ateu, escreveu a introdução do livro. E tanto na Europa como na América, são os protestantes liberais que o recomendam. Tudo isso não é senão o desenvolvimento do antigo catolicismo romano humanista transformando-se no novo catolicismo romano liberal; e o velho liberalismo humanista protestante movendo-se progressivamente na mesma direção, no novo liberalismo da neo-ortodoxia. Assim, em nossos dias, a diferença entre a Rocha humanista e o novo protestantismo liberal, o neo-ortodoxo, é de detalhe, e não básica.

Conclusões
Isto nos leva a perceber, como primeira conclusão, de que não existe uma verdadeira razão para que não haja um movimento em direção à união entre o catolicismo romano e o protestantismo liberal. Quando o arcebispo de Canterbury visitou o Papa, disse: “Já não há necessidade de nos estorvarmos um ao outro. Pois, se já não estamos um contra o outro, estamos um pelo outro, e assim podemos ser gloriosamente livres para estar juntos por Jesus Cristo e pela verdadeira unidade de Sua Igreja. Eu digo expressamente «unidade» e não «união», porque a união ou re-união se baseia numa reconciliação de jurisdições e autoridades. Porém, a unidade é só de espírito, e nesse espírito...podem entrar nas igrejas facilmente, e inclusive já estão entrando na atualidade“.

Isto é simplesmente um exemplo do que temos estado dizendo. O catolicismo romano e o novo protestantismo liberal descansam sobre a mesma base, e não existe nenhuma razão em absoluto, exceto com respeito a detalhes, para que não se unam. Qualquer conceito de verdade absoluta foi expulso em ambos campos.

Os escritos de um homem como o jesuíta norte-americano John Courtney Murray devem ser entendidos nessa estrutura. Ele e seus colegas estão instando para que os EE.UU., e também os países do Norte da Europa de tradição reformada, comecem a se desenvolverem sobre a base do conceito católico-romano de “lei natural”. Os católico-romanos instam nisto porque afirmam, com bastante razão, que os EE.UU. (como toda a cultura norte-européia) não têm ainda uma base, ou consenso, sobre o que fazer nos domínios da moral social, do direito, do governo, etc. Nisto tem razão quem pensa como Murray; porém o motivo pelo qual os EE.UU. e demais países mencionados não têm ainda uma base ou consenso para atuar, é que, tendo renunciado ao que a Reforma ensinou, tornaram-se abruptamente humanistas, e não têm absolutamente ao que se referir, ou sobre o que fundamentar suas ações.

Porém, o conceito católico-romano de lei natural é igualmente humanista e sem um absoluto em relação ao qual atuar. Temos visto que o humanismo entrou no sistema católico-romano a partir de Constantino, e especialmente que o catolicismo romano liberal moderno é devastadoramente humanista. O mesmo J.C. Murray reconhece tudo isso quando diz que a noção de lei natural é pré-cristã, anterior até mesmo aos antigos gregos, e que foi Tomás de Aquino que modelou e poliu este conceito. Isto está especificamente relacionado com as pinturas de Rafael e Miguel Ângelo no Vaticano. Faz parte do intento católico-romano para alcançar a síntese entre o pensamento humanista e o bíblico; e no âmbito do governo, o direito e a moral social, deve finalmente dar como resultado sempre conclusões humanistas e, portanto, relativas. Assim, por exemplo, a revista “Time”, de 12 de dezembro de 1960, tratando sobre o conceito de lei natural que sustenta John C. Murray, disse: “O critério de bom e mal deve ser achado na natureza do homem; o homem é — de maneira natural — um ser social; e por isso, o bem da sociedade é o do homem. O robô, por exemplo, é mal porque subverte a base da vida social, já que faz alguma mal, no terreno privado, a outro. Quando há conflito entre a satisfação das necessidades naturais, o racional (e por isso, legal) é subordinar a mais baixa à mais alta. Assim, a auto-conversação é algo bom; porém, a oposição arriscando a própria vida quando a exige o bem da sociedade, é algo mal”.

Do ponto de vista bíblico, o pecado é tal porque é contra Deus, não porque seja contra a sociedade. Quando prejudicamos a um ou vários homens é pecado, não porque tenhamos lhes prejudicados, mas porque lhes ocasionar danos contradiz a existência, o caráter e a lei de Deus. Assim, pois, o sistema bíblico é não-humanista , e absoluto. Porém, o sistema católico-romano é humanista e relativo, primeiro em sua teologia — inclusive em sua visão de Deus —, e logo em sua aplicação prática da lei natural. O conceito católico-romano de lei natural é parte da “sistemática síntese” de que fala Argan quando trata da arte de Rafael.

Na teologia católica-romana achamos uma linha ininterrupta entre o homem tal como foi criado, o homem pecador, e o homem redimido. No pensamento católico-romano a queda do homem não foi realmente total; e a salvação consiste unicamente na adição de uma justiça infundida no indivíduo. Esta linha ininterrupta é a base de seu conceito de lei natural. O ensinamento bíblico é radicalmente diferente: existe um rompimento total na queda de homem, e outra vez o mesmo na justificação. Por causa de tal queda, o homem permaneceu verdadeiramente morto. Na justificação, este passa do estado de verdadeira morte para o de vida real. Segundo a Sagrada Escritura, o homem, depois de sua queda, ainda é verdadeiramente “imagem” de Deus, no sentido de que permanece como criatura moral e racional. Ser uma criatura moral e racional depois da queda quer dizer, segundo a Bíblia, três coisas:

I. — O homem não redimido, todavia, pode desejar significância porque se acha ainda no universo para o qual foi criado; ela ainda é moral e racional. O pintor não redimido ainda pode pintar, o que ama ainda pode amar, etc.
II. — Como diz Romanos 1:19-20, o fato de que o homem permanece como um ser moral e racional o condena, porque dentro de si, em sua consciência, e na criação que o rodeia, tem testemunhas que lhe dizem que vivemos num universo moral-pessoal e que há um Criador. O fato de que o homem não redimido tenha uma consciência que o condena, está relacionado com o de que continua sendo um ser moral. O fato de que deveria ser capaz de pensar e saber, por causa da criação que o rodeia, que há um Deus, está relacionado com o de que continua sendo um ser racional. Que tenha ainda uma consciência, que continue amando, que continue anelando e buscando a beleza, o condena, porque estas coisas lhe indicam e deveriam levar-lhe numa direção exatamente oposta à que constitui a conclusão lógica de toda crença não cristã. A conclusão lógica de todas elas é que o universo é impessoal e amoral.
III. — Que o homem seja ainda um ser moral e racional e, portanto, não uma máquina, estabelece uma situação em que pode ouvir o Evangelho, e começar a refletir.

Porém na queda, o homem morreu. A força do existencialismo secular consiste em que reconhece e afirma que o homem está morto. Os existencialistas estão de acordo com a Bíblia neste ponto básico. Contudo, esta nos diz o porque o homem se acha nesta condição, e nos dá o remédio para a mesma. O homem foi criado com o propósito de que amasse a Deus com todo o seu coração, com toda sua alma e com toda sua mente, e havendo-se rebelado, é culpado, e está morto e sem propósito. Depois da queda histórica no Éden, a culpabilidade do homem lhe separa totalmente de Deus, e todas as relações secundárias estão pervertidas — as relações do homem consigo mesmo, com os demais, e com a criação —. A noção bíblica é absolutamente diferente da opinião de que existe uma linha ininterrupta, através da queda, desde a criação até a salvação. O homem, em sua rebelião contra Deus, destruiu o propósito primário para o qual foi criado e, portanto, todas as coisas estão pervertidas. De acordo com a noção bíblica, o homem se torna, na salvação, sobre a base da obra consumada de Cristo, uma nova criatura nEle, e, ainda que não de modo perfeito nesta vida, porém todavia real, todas as relações secundárias ocupam assim seu lugar devido. Em outras palavras: segundo a mente da Escritura, um humanismo não-regenerado não chega a ser humano e conduzirá ao infra-humano em todos os aspectos da vida, incluindo um consenso para a moral, o direito ou o ponto de vista social. Assim, pois, edificar sobre o conceito católico-romano de lei natural, ou sobre qualquer outro conceito humanista não-regenerado, é construir sobre o que conduzirá a algo que está por baixo da verdadeira humanidade, e que reduz progressivamente o homem à condição de máquina ou animal.

Ou, para dizer de outro modo: sendo a Igreja Católica Romana basicamente humanista, deve tratar sempre com o relativo, isto é, é o posto ao guardião do Absoluto, seja no entendimento, seja na moral. Na noção bíblica, todos os elementos humanistas estão eliminados. Na do catolicismo romano, todos os elementos humanistas básicos estão presentes.

O homem vive hoje num vazio total, busca desesperadamente uma base, e o catolicismo romanos lhe está recomendando que aceita como tal seu conceito de lei natural. Este possui um atrativo especial para os intelectuais, porém quando é examinado, se vê que não é uma base absoluta de maneira alguma, e que na realidade está relacionado com todas as demais formas de humanismo que nos assediam. Existem o humanismo protestante liberal, o comum norte-americano, e o mais recente, o socialismo, elaborado pelo polaco Adam Schaff. Este último é a nova variedade comunista de humanismo. O humanismo católico-romano é só uma parte deste quadro, e não provê solução alguma — todas estas vozes juntas se acham no âmbito de um retorno do mundo humanista gentio ao que existia antes de Jesus Cristo, porém tanto mais grave visto que seus componentes são universais. Existe pouca possibilidade de revolução, e não lugar para onde ir.

A segunda conclusão
A segunda conclusão é, por conseguinte, que o catolicismo romano não difere basicamente, em relação ao consenso de lei natural que está oferecendo ao homem em seu dilema, das outras formas humanistas — como sua teologia, tão pouco difere no básico das demais concepções humanistas, sendo a base de tudo isso o fato de que o catolicismo romano adora a um Deus imperfeito — Aceitar o conceito católico-romano de lei natural é viver sem base absoluta, e isso pode acarretar tão somente como resultado que a arbitrária voz da igreja venha a ser a norma, como ocorreu antes da Reforma. Transladar-se do vazio do pensamento geral de nosso século ao pensamento católico-romano, com relação ao governo, o direito, a sociedade, etc., é, no final da contas, passar só do vazio para outro vazio, sendo a norma a arbitrária e totalitária voz da igreja.

A Igreja primitiva e a Reforma, como temos visto, descansavam sobre duas colunas não humanistas, e na Reforma — quando um número suficiente de homens criam nestas coisas —, elas proviam uma base absoluta para a sociedade, o governo, o direito, etc. Porém agora que o mundo ocidental pós-cristianismo não crê ainda nestas coisas, não existe uma base, e o caminho que se segue conduz ao caos, ou ao totalitarismo em qualquer de suas manifestações. Isto é, segue-se esse caminho, a menos que Jesus Cristo volte, ou que de novo haja um número suficiente de homens que creiam e atuem nas e sobre as duas colunas não-humanistas tantas vezes mencionadas, e detenham essa marcha.

A terceira conclusão

A terceira conclusão é que os verdadeiros evangélicos devem permanecer sobre a base das duas colunas não-humanistas sem vacilar, ainda que isso signifique permanecer sozinhos. De outro modo, não constituiremos uma ajuda real na salvação de almas, e não seremos úteis na escuridão moral do século XX, quando o homem se torna progressivamente menos humano, tanto na vida privada como na pública, em ambos lados da Tela de Ferro. O cristianismo tem algo para dizer no século XX no que diz respeito ao direito, ao governo, à vida social, às artes, etc.; porém, não pode dizê-lo se compromete as duas colunas não-humanistas. Tudo isso significa permanecer tão claramente apartado do chamado católico-romano para com a lei natural, ou do chamado das conclusões sociológicas neo-ortodoxas nas pessoas de Brunner, Niebuhr, etc., como do humanismo popular norte-americano. Isto não pode se fazer na carne, senão que deve ser feito no poder do Espírito Santo, tomando acrescentada força no Senhor, conforme nosso complexo religioso-cultural se torna cada vez menos cristão. Em breves palavras, conforme vem a ser cada vez mais como o que circundava à Igreja primitiva. Porém, qualquer coisa que seja menos que o indicado, será finalmente a negação de nossa herança das duas colunas exclusivas não-humanistas, e nos fará ineficazes para ajudar tanto às pessoas individualmente, como à sociedade.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Livro: "O Jesus dos Evangelhos: mito ou realidade?"

Um debate entre William Lane Craig e John Dominic Crossan

Editora Vida Nova

O VERDADEIRO JESUS QUEIRA, POR FAVOR, FICAR DE PÉ!

O Jesus que andou pelas ruas de Nazaré é o mesmo Jesus a quem os Evangelhos atribuem milagres e divindade? Os cristãos podem legitimamente afirmar que se trata realmente da mesma pessoa? Em suma, quem é o “verdadeiro Jesus”?


Este livro é a primeira tentativa de diálogo entre conservadores e liberais em torno do Jesus histórico, tomando por base um debate recente entre John Dominic Crossan, ex-codiretor do Jesus Seminar [Seminário Jesus], e o evangélico conservador William Lane Craig. Na busca por se manter imparcial em sua apresentação do debate habilmente moderado por William F. Buckley Jr., a obra apresenta ainda a reflexão de quatro especialistas no assunto: Robert Miller e Marcus Borg, que representam o Seminário Jesus, e Craig Blomberg e Ben Witherington III, que oferecem as respostas conservadoras.

domingo, 12 de maio de 2013

Os casos de Estupro e Acefalia justificam a legalização do aborto no Brasil?


"Segundo dados não oficiais, ocorrem 4,5 milhões de aborto por ano no Brasil. Isso é um bom argumento para se usar diante do apelo ao aborto tendo o estupro e a acefalia como validade. Pelo visto esses caras querem nos propor que 4,5 milhões de mulheres foram estupradas e tragicamente ficaram grávidas. Ou então, que o Brasileiro tem um problema genético seríssimo, pois tá todo mundo nascendo sem cérebro neste país". 

Pipe

sábado, 11 de maio de 2013

Livro: "A Inquisição na Espanha" de Henry Kamen

Editora Civilização Brasileira

Clássica obra de Henry Kamen que conta a história da Inquisição Espanhola e os números reais de pessoas perseguidas e mortas.

O interessante nesta obra é que ela desmente os números exorbitantes citados pelos ateus como números em milhões.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

O Deus "desordenado" da ciência: repensando John Polkinghorne


Uma recente conferência em Oxford reuniu cientistas-teólogos para discutir a obra de John Polkinghorne (foto).

A análise é do escritor e jornalista inglês Mark Vernon, autor de "After Atheism: Science, Religion and the Meaning of Life" [Depois do ateísmo: Ciência, religião e o sentido da vida] (Palgrave Macmillan, 2008). O artigo foi publicado no sítio Religion Dispatches, 29-07-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto:
O Departamento de Física da Universidade de Oxford é uma mistura de edifícios novos e antigos. Em um labirinto de salas, seus cientistas vão atrás de interesses desde a computação quântica até a cosmologia teórica. A diversidade diz muito. Como uma árvore de conhecimento, a física moderna tem galhos que vão para todas as direções.

Exatamente do outro lado do departamento, está um edifício muito diferente: oKeble College. Sua estrutura unificada e gótica é inesquecível – construída em tijolos policromados, às vezes referido como estilo "santa zebra". O "santa" refere-se ao fundador do colégio vitoriano, John Keble, famoso por liderar o renascimento católico na Igreja da Inglaterra.

Hoje, o Keble College parece olhar para o seu vizinho do outro lado da rua como se estivesse refletindo sobre o que a ciência fez com a religião. Assim, os auditórios de aula do departamento de física foram um excelente lugar para acolher uma conferência justamente sobre esse assunto, celebrando e criticando o trabalho de John Polkinghorne, um dos cientistas-teólogos mais conhecidos do nosso tempo.

Na primeira parte de sua carreira, Polkinghorne foi um físico matemático, chegando à posição de professor da Universidade de Cambridge. Então, em 1979, renunciou à sua cátedra e estudou para se tornar sacerdote anglicano. No quarto de século seguinte, ele escreveu cerca de duas dezenas de livros sobre a relação entre ciência e religião. Um homem encantador para se conhecer, entre papéis e apresentações, ele fala tão comodamente com humildes jornalistas quanto com seus ilustres colegas.

Polkinghorne se descreve como um teólogo "de baixo" [bottom-up]. Ele está preocupado em mostrar não só que a ciência moderna é compatível com a crença cristã ortodoxa, mas também que o crente em Deus pode ter uma base tão racional para o seu compromisso quanto o cientista tem para o seu. Ele toma emprestada uma noção apresentada pelo filósofo Michael Polanyi, de crença bem motivada, que procura: "um estado de espírito em que eu possa manter com firmeza o que eu acredito ser verdade, embora saiba que possa ser concebivelmente falso".
Isso torna a versão de Polkinghorne acerca da teologia natural – aquela parte da teologia que olha para a razão e a natureza ao invés da revelação – mais atraente do que a de seus contemporâneos Alister McGrath e Richard Swinburne. Assim argumentou um colaborador, Rodney Holder.

Por exemplo, McGrath insiste que a teologia natural deve ser incorporada à revelação de Deus: ela fala aos cristãos acerca do Deus que eles já conhecem como Trindade. Mas McGrath também diz que a teologia natural pode levar os não crentes a Deus. Por isso, ele emprega a razão e a natureza contra seus oponentes ateus, não apenas em seu livro "The Dawkins Delusion" [A ilusão de Dawkins]. Coloque as duas afirmações junto, porém, e parece haver uma inconsistência, ressaltou Holder.

Por outro lado, a teologia natural de Richard Swinburne utiliza a teoria da probabilidade para argumentar que Deus é a explicação mais provável para os fenômenos naturais, da experiência religiosa à afinação cósmica. Mas essa abordagem é problemática, continua Holder, em parte porque as probabilidades sempre podem ser questionadas, e em parte porque ela só leva a um Deus racionalista, e portanto sereno, dos filósofos.

Polkinghorne é diferente. Ele acredita que a teologia natural nos mostra coisas sobre Deus que não podem ser apreendidas por meio da revelação apenas. Ela não oferece provas de Deus, mas oferece sim insights. Por exemplo, a ciência sugere não só que Deus criou o tempo a partir da eternidade, a doutrina tradicional, mas também que Deus realmente experimenta a temporalidade e não sabe o futuro. A teologia natural de Polkinghorne pode ser resumida no comentário do teólogo Bernard Lonergan: "Deus é a explicação totalmente suficiente, o êxtase eterno, vislumbrado em cada grito de `Eureka` arquimediano". Isso é, concluiu Holder, profundamente gratificante.

Fraser Watts, o cátedra Starbridge em ciências e teologia naturais na Universidade de Cambridge, não foi tão otimista. Ele fez críticas a Polkinghorne, embora em um espírito de respeito. Tomemos a aparente sintonia fina do universo, disse ele. Os crentes em Deus precisam ser cautelosos para não fazer uma confusão teológica com aquilo que também é conhecido como o "princípio antrópico", que basicamente afirma que o universo é como é porque, de outra forma, os seres humanos não estariam aqui para observá-lo. Por um lado, os físicos poderão um dia ser capazes de explicar isso dentro do domínio da ciência. Por outro, reivindicar isso como evidência de desígnio de Deus requer uma habilidade epistemológica – um movimento da ciência, que concebe o cosmos como falta de ação, à religião, que concebe o cosmos como repleto de propósito e intenção.

Enquanto isso acontece, os físicos podem estar no meio do caminho rumo à explicação da sintonia fina, por intermédio da chamada teoria do multiverso. Esta apresenta o nosso universo como apenas um dentre muitos, e assim mostra que não é nenhuma surpresa que o nosso seja "finamente sintonizado", pois não estaríamos aqui para perceber isso se não existíssemos. Assim, é melhor, argumenta Watts, não fazer sua teologia afirmando vantagens em relação à ciência. Os cristãos podem chegar a um acordo com os multiversos também, concluiu.

Talvez o artigo mais impressionante da conferência foi dado pela filósofa da ciência e não-crente, Nancy Cartwright. Ela é bem conhecida por sua ideia de que a ciência não é tão unificada como disciplina quanto os cientistas tendem a pensar que seja. Observando cuidadosamente como a ciência realmente procede, ela concluiu que ela faz uso de uma variada gama de princípios e teorias para descrever os fenômenos que descreve, e que estes não podem ser reduzidos a algumas poucas e simples leis que poderiam ser fundidas em uma "teoria de tudo".
O que isso pode significar para os crentes em Deus, sugeriu ela (meio em tom de gozação) é que Deus não é um legislador, mas sim um engenheiro. Uma divindade compatível com a ciência moderna seria aquela que pega o material bruto da natureza e o molda nisto, e depois naquilo. Uma semente seria um exemplo dessa engenharia divina, porque, mantidas inalteradas todas as outras condições, ela produz uma planta. Em geral, se o livro da ciência parece estar escrito em várias linguagens, isso talvez seja porque o livro da natureza também o é.

Para o pensamento de Cartwright, isso na verdade levaria a uma noção mais atraente da divindade do que a tradicional com a qual ela foi criada, já que é um Deus que ama a bagunça! "Glória a Deus pelas coisas malhadas" [Glory be to God for dappled things], escreveu Gerard Manly Hopkins. Exatamente, ela concordou.

Sua plateia de teólogos-cientistas escutava nervosamente, talvez como o Keble College faz com os laboratórios de física. Alguns temiam que ela pudesse ser interpretada como defensora do Design Inteligente. E o próprio Polkinghorne não engolia isso. E as leis de conservação da física, perguntava ele, de energia, momentum e carga? Elas são claramente universais.


E elas apontam para a unidade da verdade e da beleza da ordem cósmica, que leva esse notável pensador para o Deus no qual ele acredita estar embaixo, em cima e por todas as partes.

terça-feira, 7 de maio de 2013

O Mito da Terra Plana

Introdução

Terra rotunda est” – Adam de Wodeham (1357) – Discípulo de Guilherme de Ockham
No livro “Aristóteles em 90 minutos”, parte de uma coleção da Jorge Zahar Editora que traz a cada volume a biografia de um grande filósofo da história, pode-se ler o seguinte trecho:
“Ao declarar que as obras de Aristóteles eram como a Sagrada Escritura, a Igreja se viu numa encruzilhada (e no caso, nos confins de uma Terra plana). O conflito que se avizinhava entre a Igreja e a descoberta científica era inevitável”. (pag. 48-49)
O autor, Paul Strathern, professor universitário e autor de romances, biografias e livros de viagens, mas não historiador nem filósofo, é apenas mais um a propagar o mito de que na Idade Média, sob a influência dogmática da Igreja Católica, acreditava-se que a Terra era plana. A ele somam-se filmes (“1492 – A Conquista do Paraíso”), músicas (“Flat Earth Society” – Bad Religion), desenhos animados (tantos que não seria possível citá-los todos), e o pior: livros escolares. Todos mostram Cristovão Colombo como um visionário – o único a acreditar que a Terra fosse redonda – lutando contra religiosos ortodoxos que, citando suas escrituras sagradas, acreditavam que o navio de Colombo cairia da borda da Terra ao atingir o horizonte.

Os gregos já sabiam!

A despeito do que você possa ter aprendido na escola nas suas aulas de História (talvez como o autor deste artigo), os gregos já sabiam mais de 2000 anos antes de Colombo que a Terra era redonda. O grego Erastótenes (276-194 a.C.) chegou mesmo a calcular geometricamente o diâmetro da Terra com uma precisão muito boa, medindo em passos a distância entre as cidades de Alexandria e Siene e conhecendo o tamanho das sombras projetadas por uma estaca nas duas cidades.
Mas você poderia perguntar: “E daí que os gregos já sabiam?” Afinal, diversas outras civilizações da mesma época, como a chinesa, realmente pensavam que a Terra era plana e continuaram pensando assim por muito tempo (os chineses só começaram a discutir a hipótese da Terra redonda no início do século XVII). Outro povo, os hebreus, usaram nos seus textos sagrados, que hoje fazem parte da Bíblia, diversas figuras de linguagem que levam estudiosos a crer que também acreditavam que a Terra fosse plana, como menções aos “quatro cantos da Terra”, por exemplo (embora também haja passagens que são usadas para provar o contrário). A diferença do pensamento grego para os outros povos é que ele influenciou enormemente a forma de pensar do ocidente e em praticamente todas as áreas do conhecimento: política, ética, ciência, lógica, filosofia, arte e muito mais, incluindo aí a toda poderosa religião Cristã.
Mas nenhum filósofo grego influenciou mais o pensamento medieval do que Aristóteles (384-322 a.C.). Aristóteles acreditava que todas as coisas eram formadas por combinações de quatro elementos: terra, água, fogo e ar, e que cada um deles possuía no universo um “lugar natural”. O lugar natural do elemento “terra”, sendo mais pesado do que todos os outros, seria o centro do universo. Uma vez que todas as coisas sólidas eram formadas por este elemento e como todas tinham igual tendência em estar o mais próximo possível do seu lugar natural, Aristóteles concluiu que a forma da Terra deveria ser esférica (note-se que esse raciocínio também exigia que a Terra estivesse no centro do Universo). Em seu livro “Sobre os Céus”, depois de longa argumentação, Aristóteles encerra a questão assim:
“Sobre a posição da Terra e da maneira de seu repouso ou movimento nossa discussão pode aqui terminar. Sua forma deve necessariamente ser esférica.”
O-Mito-da-Terra-PlanaA prova da esfericidade da Terra, segundo Aristóteles, publicado em uma edição do livro De sphaere do século XVI.
Platão, mestre de Aristóteles, também acreditava na forma esférica da Terra; ele diz em seu diálogo“Fédon”: “Minha convicção é de que a Terra é um corpo circular no centro dos céus”. Embora Platão não tenha sido tão importante quanto seu pupilo para o pensamento científico medieval, uma versão um pouco modificada de sua filosofia, conhecida por neoplatonismo, influenciou fortemente os primeiros filósofos religiosos, especialmente aquele que foi um dos maiores teólogos cristãos: Santo Agostinho (354-430). Quanto à forma da Terra, Agostinho não parecia duvidar de que ela fosse esférica, embora se mostrasse um tanto pertubado com a idéia de pessoas de ponta cabeça habitando terras do outro lado do mundo. No seu livro “A Cidade de Deus” (De Civitate Dei) ele escreveu:
“Apesar de estar supostamente ou cientificamente provado que a Terra tem a forma esférica, disto não decorre que o outro lado do mundo seja desprovido de mares, nem decorre imediatamente que, sendo desprovido de mares, seja habitado.”
Ilustração do livro Almagestum novum, de 1651, posterior a Colombo, mas que descreve o céu conforme o modelo platônico.

Mas alguém realmente acreditava que a Terra era plana?

O-Mito-da-Terra-Plana02Enquanto a filosofia de Platão (sob a forma levemente adulterada do neoplatonismo) continuou, durante os primeiros séculos da Idade Média, a ser cultivada pelos cristãos desejosos em dar um estofo filósofico a sua nova religião, os livros de Aristóteles e boa parte do restante do conhecimento grego se perderam depois do esfacelamento do Império Romano no século VII. Durante este período, conhecido por “Idade das Trevas” (período medieval que costuma ser definido como indo do ano 600 ao ano 1000 D.C), alguns membros da Igreja publicaram de fato trabalhos que defendiam a idéia de uma Terra plana. Um deles foi o monge Cosmas Indicopleustes. Cosmas, um ex-mercador que trocou o comércio pelo hábito, escreveu no ano de 547 o livro chamado “Topografia Cristã” no qual expunha sua visão geográfica do mundo baseada em interpretações literais da Bíblia. Cosmas imaginava a Terra como um grande baú, sendo o firmamento a “tampa” deste baú, e ridicularizava a crença pagã numa Terra redonda com os velhos argumentos de pessoas de ponta cabeça, chuva caindo para cima, etc. Outro defensor da Terra plana foi o padre Lactâncio (265-345) e seus argumentos eram igualmente baseados em interpretações literais de metáforas bíblicas. Além destes sabe-se que, Severian de Gabala (380), e possivelmente Theodoro de Mopsuestia (350-430) e Deodoro de Tarsus (394) defenderam ideais de uma Terra plana.
Sobre estes autores no entanto, a maioria dos historiadores modernos concorda que foram praticamente ignorados em suas épocas ou no mínimo encarados com pouca seriedade nos círculos intelectuais; Cosmas por exemplo foi considerado um tolo ignorante pelo filósofo grego cristão John Philoponus.

Porque a Igreja adotou a Teoria da Terra Redonda?

No século XIII a Europa começou a reerguer-se do obscurantismo em que havia mergulhado e as obras gregas começaram finalmente a ser redescobertas, trazidas pelos árabes. Assim que tiveram contato com as obras de Aristóteles, os intelectuais cristãos imediatamente se encantaram com a complexidade e sofisticação filosófica do corpus aristotélico. Aristóteles não escrevia somente sobre o mundo natural, mas sobre ética, teatro, política, matemática, e muito mais com uma profundidade e um rigor lógico sem par na era medieval (a reverência por Aristóteles era tamanha que ele era chamado simplesmente por “O Filósofo”). Mas foi São Tomás de Aquino (1225-1274), um dos expoentes da teologia cristã, o grande responsável por embutir a ciência, a filosofia e a cosmologia de Aristóteles no cristianismo. Tomás transformou Aristóteles no suporte filosófico de toda a doutrina cristã. A partir daí, questioná-lo era o mesmo que questionar a própria existência de Deus.
Podemos agora voltar ao trecho do livro da Jorge Zahar Editor que abriu este artigo:
“Ao declarar que as obras de Aristóteles eram como a Sagrada Escritura, a Igreja se viu numa encruzilhada (e no caso, nos confins de uma Terra plana). O conflito que se avizinhava entre a Igreja e a descoberta científica era inevitável”.
Podemos entender que autor confundiu algumas coisas. Confundiu “Terra Plana” com “Geocentrismo”. Como se viu, o mesmo raciocínio Aristotélico que concluía pela redondeza da Terra também exigia que ela fosse o centro do universo, e isto sim causou o conflito entre ciência e a religião, mencionado pelo autor, que se viu com Giordano Bruno, Copérnico e Galileu.

Outras evidências pré-Colombianas

John Holywood (isso mesmo), monge inglês que também atendia pelo nome latinizado de Joanes de Sacrobosco era O-Mito-da-Terra-Plana03contemporâneo de Tomás de Aquino. Professor de Astronomia na Universidade de Paris, Sacrobosco foi o autor do livro astronômico com o maior número de edições até hoje, o “Tractatus de Sphaera Mundi”, publicado pela primeira vez em 1473. O “Sphaera” era um manual de astronomia e geografia muito utilizado pelos portugueses durante a era das grandes explorações e não deixa dúvidas aos historiadores modernos (a começar pelo nome), de que a esfericidade da Terra fosse um fato bem reconhecido na época.
Um dos mais fascinantes livros medievais é o “Liber Chronicarum” (“Crônicas de Nuremberg”). Com mais de 1800 ilustrações e 600 páginas, este volumoso livro contava a história ilustrada do mundo desde o Genêsis até aquela data e foi publicado originalmente em maio de 1493 antes que a descoberta da América fosse conhecida. A reprodução do “Universo Ptolomaico” (abaixo), representando o universo com suas esferas concêntricas ocupadas pelos planetas conhecidos (incluindo a Lua e o Sol) é bastante clara: a esfericidade da Terra era um fato tão bem estabelecido quanto o geocentrismo.

Encontrando os culpados pelo mito

Se a esfericidade da Terra não era questionada nos círculos eruditos da Idade Média então quem inventou o mito da Terra plana? (ou mais apropriadamente: o mito de que as pessoas acreditavam que a Terra fosse plana). O historiador J. B. Russel, no livro “Inventing the Flat Earth” (“Inventando a Terra Plana” – 1991), procurou os responsáveis pela propagação do mito e descobriu dois culpados: o francês Antoine-Jean Letronne (1787-1848) e o americano Washington Irving (1783-1859). Letrone, um historiador muito respeitado mas com um grande preconceito religioso, foi responsável por atribuir ao “Topografia Cristã” de Cosmas Indicopleustes uma importância histórica que ele nunca teve, concluindo que todos na Idade Média acreditavam que a Terra era plana. Seria como se daqui a mil anos alguém encontrasse um obscuro trabalho científico questionando a evolução e afirmasse que os cientistas do século XXI não acreditavam na evolução. Segundo Russel, devido ao enorme prestígio e reputação de Letrone, esta interpretação particular dos fatos não foi questionada pelos historiadores posteriores e passou a circular como verdade nos meios intelectuais.
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Washington Irving, por outro lado, era antes de nada mais um romancista. Você na certa o conhece como o autor do conto que já virou desenho e filme: “A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça”. Como historiador entretanto, costumava levar sua habilidade de escrever ficção para suas biografias, romanceando fatos que nunca aconteceram. Segundo o pesquisador Owen Gingerich, em seu artigo “Astronomy in the Age of Columbus” (“Astronomia no Tempo de Colombo”; Scientific American, novembro de 1992) logo após a revolução americana Irving estava procurando por um herói não inglês para contrapor ao famoso explorador inglês Sebastian Calbot, o primeiro homem a chegar ao Polo Norte, e enxergou em Colombo a pessoa certa.
Na biografia de Cristovão Colombo, “Columbus”, publicada em 1828, Irving descreve um episódio real – o Conselho de Salamanca em que Colombo apresenta seu projeto a um grupo de religiosos e leigos – porém “enriquece” a narrativa afirmando que Colombo foi acusado de heresia por sustentar que a Terra fosse redonda, o que supostamente seria contrário às Escrituras. É verdade que Colombo sofreu sérias objeções das autoridades presentes, mas a questão nunca foi se a Terra era redonda ou não, e sim o tamanho desta. Colombo supunha que a Terra fosse muito menor do que é na realidade (considerava-a com apenas 20% de seu tamanho real) enquanto seus opositores diziam ser impossível chegar às Índias percorrendo uma distância que consideravam muito maior (os opositores de Colombo estavam certos; se a América não estivesse no meio do caminho de Colombo ele e sua tripulação teriam morrido à míngua de recursos). A narrativa conforme floreada por Irving transformou o debate de Salamanca em um símbolo da luta entre o campeão da liberdade científica e o dogmatismo teólogico, e caiu no gosto popular.
Letrone deu ao mito da Terra plana sua base história, Irving sua carga emocional. Mas o mito realmente ganhou a força que tem até hoje quando John Draper (1811-1882), um físico violentamente anti-católico, publicou em 1873 o livro “A História do conflito entre a Ciência e a Religião” utilizando o mito da Terra plana como exemplo de como as crenças religiosas eram estúpidas e atrasadas e necessariamente se opunham ao progresso da ciência. Através de Draper o mito da Terra plana chegou como verdade absoluta até o início do século XX, e só nos anos 20 começou a ser questionado.