quinta-feira, 20 de agosto de 2015

A Teia da Aranha

Por Rivelino V. D. Montenegro

À medida que se aprofunda o conhecimento científico sobre as estruturas e mecanismos dos seres vivos, encantamonos cada vez mais com a complexidade e a funcionalidade de tais sistemas biológicos, mesmo entre aqueles considerados “simples” ou “primitivos”.

O termo Biomimética se tornou comum nos meios científicos, e se refere ao trabalho de diversos cientistas (engenheiros, químicos, físicos, biólogos, etc.) que tentam copiar os processos biológicos e aplicá-los em diferentes áreas tecnológicas e científicas.

Introdução
A história está repleta de exemplos de engenheiros, cientistas e artistas que se inspiraram na natureza. Dentre eles, podemos citar os irmãos Wright, que voaram após observar o vôo rasante dos abutres. Inspirado na estrutura dos ossos, Eiffel projetou a famosa torre que leva o seu nome, e que suporta seu enorme peso em suas curvas presas de cobras, e o velcro, que foi baseado no campo. E mais recentemente, tintas que elegantes (1).

Outros exemplos são as pontas o mesmo princípio daqueles carrapichos que imitam a superfície da flor de Lótus, sendo de agulhas hipodérmicas moldadas como grudam nas meias durante uma caminhada dessa forma tintas auto-limpantes.

Neste campo científico, um dos produtos naturais que mais chamam a atenção é a teia de aranha. Inúmeros cientistas em todo o mundo tentam copiar as propriedades da seda que a aranha produz e, de maneira muito mais interessante ainda, tentam reproduzir o método que as aranhas utilizam para fabricar a teia.

A tenacidade, a resistência e a elasticidade desta seda continua a intrigar os cientistas, que se perguntam o que dá a este material natural suas qualidades inusitadas. Mais fina que um fio de cabelo, mais leve que o algodão, e (nas mesmas dimensões) mais forte que o aço, a teia ”atormenta” os cientistas que tentam copiar suas propriedades, ou sintetizá-la, para produção em larga escala. Várias aplicações desse novo material surgem na mente dos pesquisadores, tais como roupas e sapatos à prova d’água, cabos e cordas, cintos de segurança e pára-quedas mais resistentes, revestimento anti-ferrugem, pára-choques para automóveis, tendões e ligamentos artificiais, coletes à prova de balas, etc (2).

Um fio comum da seda de teia de aranha é capaz de estender-se por até 70 km sem se quebrar sob seu próprio peso, e pode ser esticado até 30 ou 40 % além de seu comprimento inicial, sem se romper, enquanto o nylon suporta apenas 20 % de estiramento (3). A seda que a aranha produz tem tal resistência que se chegou à hipótese de que, caso fosse possível construir uma teia com a espessura do fio equivalente ao de uma caneta esferográfica, tal teia seria capaz de parar um Boeing 747 em pleno vôo! (3, 4)

Os fios de seda da teia de aranha já foram usados antigamente nos retículos de lunetas astronômicas, micrômetros e outros instrumentos ópticos.Algumas tribos da América do Sul empregaram as teias de aranha como hemostático em feridas. Pescadores da Polinésia usam o fio da aranha Nephila, que é exímia tecedeira, como linha de pescar. Em Madagascar, nativos capturavam as aranhas Nephila, e obtinham rolos de fios, que eram usados para fabricar tecidos de cor amarelo-dourada (3). Algumas tribos na Nova Guiné usam teias de aranha como chapéu para se protegerem da chuva.

Muitas fibras sintéticas, tais como o kevlar e fibras de polietileno de altíssima densidade, atingem módulos de elasticidade (Young) e tensões de estiramento elevadíssimos, devido a
cristalinidades muito altas. Em virtude da alta cristalinidade, estas fibras tendem a ser quebradiças, não sendo assim muito resistentes quando sob compressão. O fio da teia de aranha, entretanto, apesar de não atingir os módulos de elasticidade (Young) extremamente altos de algumas fibras sintéticas, possui um alto alongamento de ruptura, e é mais forte sob compressão (5).

Há várias glândulas localizadas no abdômen da aranha, as quais produzem os fios de seda. Cada glândula produz um fio para propósitos específicos. São conhecidas sete diferentes glândulas. Cada aranha, entretanto, possui apenas algumas dessas glândulas e não todas ao mesmo tempo.
As glândulas conhecidas como Ampullaceae (Maior e Menor), são usadas para produzir os fios por onde a aranha anda. A glândula Pyriformes é usada para produção dos fios conectivos. A glândula Aciniformes produz fios para o encapsulamento da presa. A glândula Tubiliformes produz fios para os casulos. A glândula Coronatae é usada para produção de fios adesivos (6). Normalmente, a aranha tem três pares de órgãos (equivalentes a “máquinas de fiar”) que produzem os fios. Mas há aranhas que possuem apenas um par ou mesmo quatro pares destes órgãos. Há pequenos tubos, que são conectados às glândulas. O número de tubos pode variar entre 2 e 50.000. A seda da teia de aranha é constituída principalmente de uma proteína que tem peso molecular de 30.000 Daltons, enquanto dentro da glândula. Fora da glândula, ela se polimeriza para dar origem à fibroína, que tem peso molecular em torno de 300.000 Daltons (6, 3). Muitas aranhas tecedeiras reciclam suas teias. Isso acontece porque a teia tem que ser renovada freqüentemente e, como na sua fabricação é gasta uma grande quantidade de nitrogênio, a aranha se alimenta da teia para reaproveitar o nitrogênio(3).

As aranhas produzem uma série de diferentes fibras, nas quais a seqüência de aminoácidos das proteínas componentes são precisamente controladas a fim de ajustar as propriedades mecânicas de cada teia para sua função específica (7).

A matéria prima inicial que as aranhas usam para tecer a teia é uma solução líqüida cristalina, contendo proteínas, que flui facilmente pelas tubulações presentes no abdômen da aranha. A solução contém 50% de proteína, concentração que normalmente acarreta altíssima viscosidade, fazendo que o processo de tecer a teia em laboratório se torne inviável. Entretanto, as aranhas conseguem resolver este problema mantendo as proteínas numa conformação enrolada enquanto estão tecendo a teia, e só em seguida é que as proteínas deixam essa conformação enrolada, esticando-se e arranjando-se para produzir a a elasticidade final do fio (8).

Os fios de seda da teia da aranha são compósitos macromoleculares de domínios deproteínasamorfas,quepossuemligações cruzadas e são reforçadas por microcristais (ß-sheets). A quantidade de ligações cruzadas e de reforços de microcristais determina importantes propriedades mecânicas (9, 10). Por exemplo, os primeiros fios a serem tecidos, que são utilizados como bases de sustentação da teia, contêm de 20 a 30 % de cristal por volume (10, 11), formando uma fibra que é rígida (módulo de Young inicial igual a 10 GPa), forte e dura (energia para rompimento igual a 150 MJ/m3). O fio adesivo utilizado para tecer a espiral contém 5% ou menos de cristal por volume e é mecanicamente semelhante a borracha bem flexível, com baixa rigidez (módulo de Young inicial igual a 3 MPa) e alta extensibilidade (10).
Muitas companhias de biotecnologia estão interessadas no desenvolvimento de proteínas transgênicas da teia de aranha para incorporação em novos materiais (8).

A construção da teia (12)

Como a aranha constrói a sua teia?
A parte mais difícil parece ser o primeiro fio. Mas a solução é simples. A aranha produz um fio que fica preso por uma das extremidades a um ponto inicial, e a outra extremidade é levada pelo vento para então prender-se em algum outro ponto (exemplos: galho de árvores, parede, etc). Neste estágio a aranha conta com a ajuda do vento (em locais sem vento a aranha precisa carregar o fio até encontrar outro ponto de fixação). Assim, forma-se a primeira ponte. A aranha, cautelosamente, cruza o fio inicial reforçando-o com um segundo fio. O processo é repetido até que o fio esteja forte o suficiente. Depois deste fio, a aranha constrói um fio folgado e em seguida, a partir deste fio, tece um terceiro formando um Y. Estes são os primeiros 3 raios da teia. Uma armação é então construída para conectar os outros raios. Os raios da teia são então terminados. A distância entre os raios nunca é maior que o alcance da aranha. Agora o fio adesivo é traçado entre os raios a partir do centro da teia, formando a espiral.

Há muitas variações (13) na maneira das aranhas construírem suas teias; o exemplo mostrado é um dos mais simples. A forma como se constrói a teia está sujeita a vários fatores, desde a espécie de aranha até as condições do ambiente onde a teia será construída.

Há vários estudos na literatura científica sobre fatores que influenciam a construção da teia. Um dos estudos mais interessantes, realizado por cientistas da NASA, mostrou que é possível detectar a toxicidade de substâncias químicas injetando-as em aranhas e verificando como a teia é então construída. Os resultados mostraram uma relação direta entre a toxicidade das substâncias e a desorganização na construção da teia, ou seja, quanto mais tóxica a substância, mais deformada será a teia. Foram testadas drogas como maconha, cafeína e outras. No caso da cafeína, por exemplo, a aranha só conseguiu tecer alguns fios e de forma bastante aleatória.
A partir destes resultados, os pesquisadores acham ser possível, com a ajuda de um programa de computador, quantificar estes efeitos e produzir assim um novo mecanismo para teste de toxicidade (14).

Por que a aranha não fica grudada na própria teia? (15)

A aranha coloca-se no centro de sua teia e ali espera imóvel que algum inseto fique preso nela. Assim que isto acontece, a aranha orienta-se na direção do inseto e move-se sem hesitar ao longo de algum dos fios radiais, afastando-se do centro da teia para rapidamente segurar a presa. Esta ação da aranha não constitui nenhum risco para si mesma, visto que toda a seda utilizada para construir o centro, os fios radiais, e os fortes fios de sustentação, não é adesiva. Somente a seda produzida para construir a espiral que conecta os fios radiais, é coberta com uma forte cola. Contudo, quando observamos a aranha andando rapidamente ao longo dos fios radiais, ela regularmente toca a espiral adesiva com suas pernas, ao se aproximar da vítima o mais próximo possível a fim de imobilizá-la, envolvendo-a com a teia e dando-lhe uma mordida venenosa fatal.

Evidentemente, a aranha não teme ficar grudada em sua própria teia, e caminha facilmente ao longo dos fios não adesivos, bem com sobre os adesivos. Como, porém, ela é capaz disso? Para responder tal pergunta somos forçados a examinar em alta resolução as pernas de uma aranha.
O que vemos num primeiro relance são duas garras escuras e serrilhadas. Elas são usadas para se ter um bom controle sobre a superfície lisa dos galhos e folhas de árvores, entre as quais a aranha constrói a teia, e também para mover-se sobre o solo. Em frente destas garras há uma garra menor, fortemente fixada, que é cercada por um certo número de pêlos encurvados. A impressionante diferença entre estes pêlos e os demais presentes em outras partes das pernas da aranha não é apenas o fato de serem encurvados, mas também deles serem providos de um considerável número de pequenos ”espinhos”. Estes pêlos e a terceira garra exercem juntos uma função crucial na capacidade das aranhas se locomoverem em suas próprias teias.

Quando a aranha coloca a ponta de uma de suas pernas contra um fio a terceira garra é inclinada para trás e sua ponta aguda direciona-se obliquamente. O fio é empurrado contra os pêlos elásticos. Então a terceira garra gira para frente, o gancho agarra o fio, forçando o fio e os pêlos para trás. Agora a perna da aranha está segurando o fio bem firme comum a área de superfície mínima do fio em contato com os ”espinhos” dos pêlos e com a margem interna da terceira garra. Para soltar o fio, o gancho da terceira garra é simplesmente levantado e os pêlos retornam para sua posição original, empurrando o fio para longe da perna. Deste modo, mesmo um fio adesivo torna-se facilmente desprendível.

Embora este dispositivo mecânico sozinho possa ser suficiente para uma aranha de jardim mover-se livremente por sua teia sem correr o risco de ficar presa nela, pode existir ainda outro mecanismo. Em alguns livros se menciona que uma secreção oleosa cobre as pernas da aranha, impedindo-a de ficar presa nos fios adesivos. Embora esta possibilidade pareça plausível, até agora nenhuma publicação científica apoiou tal afirmação. Por enquanto, a única explicação para o fato da aranha não ficar presa à sua própria teia é o formato muito especial das extremidades de suas pernas.

Considerações Finais
As propriedades mecânicas da seda da teia de aranha são superiores à maioria das fibras sintéticas. Além do mais, a teia exibe um comportamento não usual no qual a tensão necessária para romper a teia aumenta com o aumento da deformação(16).

Associada à verdadeira engenharia aplicada na construção da teia, a complexidade com que a aranha tece e controla a composição química da teia (processos ainda longe de serem copiados) para cada finalidade bem específica, mostra o quanto tais sistemas biológicos requerem um planejamento e, portanto, um planejador.

Segundo os evolucionistas, as aranhas surgiram há aproximadamente 125 milhões de anos, porém estudos recentes mostram que a teia parece ter sofrido pouquíssimas modificações durante todas essas eras(17,18), ou seja, parece que as aranhas já surgiram com um sistema extremamente desenvolvido para solucionar o problema da sobrevivência da espécie(19), o que parece ser bastante paradoxal para a teoria da evolução!

Sim senhor! É impressionante a complexidade de uma teia de aranha. Mais impressionante ainda é alguém ter fé que surgiu por acaso este complexo.

A TEIA DE ARANHA MAIS ANTIGA CONSERVADA EM ÂMBAR?
Em um pedaço de âmbar achado no Líbano foi encontrado o tesouro mais antigo da aranha – um filamento sedoso de uma teia. Segundo os cálculos evolucionistas teria 130 milhões de anos – 90 milhões de anos mais velho que os restos paleontológicos conhecidos até agora. A teia tem 4 milímetros de comprimento e é do tipo de seda viscosa similar às fibras pegajosas que algumas aranhas modernas usam para caçar suas presas. O biólogo que o estudou, Samuel Zschokke, da Universidade de Basel, na Suíça, disse que, apesar de sua idade, tem todas as semelhanças com a teia de aranha moderna. Zschokke descreve este delicado fóssil na revista Nature de 7 de agosto. Indica que sem dúvida pertence a um ancestral das aranhas de “patas de pente” que são os aracnídeos que produzem teias viscosas sobre as árvores, e assim a teia foi englobada pela resina que exsuda da árvore. (Sc.N.Ag. 30-03).

Bibliográficas
1. Ball, P. Nature 2001, 413-416.
2. Vide o site: www.sciencenews.org/sn_edpik/ps_5.htm
3. Vide o site: www.geocities.com/~esabio/aranha/teia_e_a_seda.htm
4. Vide o site: www.xs4all.nl/~ednieuw/spiders/info/spindraad.htm
5. Valluzzi, R.; Szela, S.; Autges, P.;Kirshner, D.; Kaplan, D. J. Phys. Chem.B 1999, 103, 11382-11392.
6. Vide o site: www.xs4all.nl/~ednieuw/spiders/infoned/webthread.html
7. Zhou, Y.; Wu, S.; Conticello, V. P.Biomacromolecule 2001, 2, 111-125.
8. Mckay, D.; Davies, M. J. Trends in Biotechnology 2001, 19, 204.
9. Denny, M., The mechanical properties of biological materials, Cambrige Univ. Press 1980, 475-559.
10. Gosline, J. M. et al., Biomimetics, A/P Press. 1995, 237-261.
11. Simmons, A. H.; Michael, C. A.; Jelinski, L. W. Science 1996, 271, 84.
12. Vide o site: www.xs4all.nl/~edni…/spiders/info/construction_of_a_web.html
13. Vide o site: www.unibas.ch/dib/nlu/staff/sz/webconstructbd.html
14. Bonner, J. New Scientist 1995, 1975, 5. 17. Gatesy, J.; Hayashi, C.; Motriuk, D.;
15. Vide o site: http://www.microscopy- Woods, J.; Lewis, R. Science 2001, 077spidersilk uk.org.uk/mag/art97b/benspid.html 291, 2603.
16. Kaplan, D. American Chemical Society 18. Selden, P. Palaeontology 1990, 33, Symposium 1994, 544, 176-184.
17. Gatesy, J.; Hayashi, C; Motriuk, D.; Woods, J.; Lewis, R. Science 2001, 291, 2603.
18. Selden, P. Palaeontology 1990, 33, 257.

19. Vide o site: http://whyfiles.org/shorties/077spidersilk

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