domingo, 21 de maio de 2017

Cânone Muratori



Por Filipe Lomboni

O Cânone Muratori, também conhecido por fragmento muratoriano ou fragmento de Muratori, é uma cópia da lista mais antiga que se conhece dos livros do Novo Testamento. Foi descoberta na Biblioteca Ambrosiana de Milão por Ludovico Antonio Muratori (1672 – 1750) e publicada em 1740. Na lista figuram os nomes dos livros que o autor desconhecido da lista considerava admissíveis, com alguns comentários. A lista está escrita em latim e encontra-se incompleta, daí ser chamada de fragmento.

Apesar de ser consensual datar o manuscrito como sendo do século VII, ele é cópia de um texto mais antigo, datado como tendo sido escrito por volta do ano 170, já que nele é referido o Pastor de Hermas e como recente o papado de Pio I, morto em 157.

Os livros canônicos mencionados na lista são aproximadamente os mesmos que se consideram hoje como canônicos neo-testamentários, com algumas variações. O Cânone de Muratori aceita quatro evangelhos, dos quais dois são o Evangelho de Lucas e o Evangelho de João, não se conhecendo os outros dois, pois falta o princípio do manuscrito, onde estariam os nomes dos dois primeiros[1]. A lista segue com os Actos dos Apóstolos e com 13 epístolas de Paulo de Tarso (não menciona a Epístola aos Hebreus). Considera falsificações as epístolas supostamente escritas por Paulo aos laodiceanos e a escrita aos alexandrinos. Nele só se mencionam duas epístolas de João, sem as descrever. Figura também no fragmento o Apocalipse de Pedro, ainda que com certas reservas ("o qual alguns dos nossos não permitem que seja lido na Igreja").
http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A2none_Muratori

...lacuna...
...aos quais esteve presente e assim o fez[1].
.
O terceiro livro do Evangelho é o de Lucas. Este Lucas - médico que depois da ascensão de Cristo foi levado por Paulo em suas viagens - escreveu sob seu nome as coisas que ouviu, uma vez que não chegou a conhecer o Senhor pessoalmente, e assim, a medida que tomava conhecimento, começou sua narrativa a partir do nascimento de João.
.
O quarto Evangelho e o de João, um dos discípulos. Questionado por seus condiscípulos e bispos, disse: "Andai comigo durante três dias a partir de hoje e que cada um de nós conte aos demais aquilo que lhe for revelado". Naquela mesma noite foi revelado a André, um dos apóstolos, que, de conformidade com todos, João escrevera em seu nome.
.
Assim, ainda que pareça que ensinem coisas distintas nestes distintos Evangelhos, a fé dos fiéis não difere, já que o mesmo Espírito inspira para que todos se contentem sobre o nascimento, paixão e ressurreição [de Cristo], assim como sua permanência com os discípulos e sobre suas duas vindas - depreciada e humilde na primeira (que já ocorreu) e gloriosa, com magnífico poder, na segunda (que ainda ocorrerá). Portanto, o que há de estranho que João frequentemente afirme cada coisa em suas epístolas dizendo: "O que vimos com nossos olhos e ouvimos com nossos ouvidos e nossas mãos tocaram, isto o escrevemos"? Com isso, professa ser testemunha, não apenas do que viu e ouviu, mas também escritor de todas as maravilhas do Senhor.
.
Os Atos foram escritos em um só livro. Lucas narra ao bom Teófilo aquilo que se sucedeu em sua presença, ainda que fale bem por alto
[2] da paixão de Pedro e da viagem que Paulo realizou de Roma até a Espanha.

Quanto às epístolas de Paulo, por causa do lugar ou pela ocasião em que foram escritas elas mesmas o dizem àqueles que querem entender: em primeiro lugar, a dos Coríntios, proibindo a heresia do cisma; depois, a dos Gálatas, que trata da circuncisão; aos Romanos escreveu mais extensamente, demonstrando que as Escrituras têm como princípio o próprio Cristo.
.
Não precisamos discutir sobre cada uma delas, já que o mesmo bem-aventurado apóstolo Paulo escreveu somente a sete igrejas, como fizera o seu predecessor João, nesta ordem: a primeira, aos Coríntios; a segunda, aos Efésios; a terceira, aos Filipenses; a quarta, aos Colossenses; a quinta, aos Gálatas; a sexta, aos Tessalonicenses; e a sétima, aos Romanos. E, ainda que escreva duas vezes aos Coríntios e aos Tessalonicenses, para sua correção, reconhece-se que existe apenas uma Igreja difundida por toda a terra, pois da mesma forma João, no Apocalipse, ainda que escreva a sete igrejas, está falando para todas.
.
Além disso, são tidas como sagradas uma [epístola] a Filemon, uma a Tito e duas a Timóteo; ainda que sejam filhas de um afeto e amor pessoal, servem à honra da Igreja e à ordenação da disciplina eclesiástica.
.
Correm também uma carta aos Laodicenses e outra aos Alexandrinos, atribuídas [falsamente] a Paulo, mas que servem para favorecer a heresia de Marcião, e muitos outros escritos que não podem ser recebidos pela Igreja porque não convém misturar o fel com o mel.
.
Entre os escritos, se contam uma epístola de Judas e duas do referido João, além da Sabedoria escrita por amigos de Salomão em honra do mesmo.
.
Quanto aos apocalipses, recebemos dois: o de João e o de Pedro; mas, quanto a este último, alguns dos nossos não querem que seja lido na Igreja.


Recentemente, em nossos dias, Hermas escreveu em Roma "O Pastor", sendo que o seu irmão, Pio, ocupa a cátedra de bispo da Igreja de Roma. É, então, conveniente que seja lido, ainda que não publicamente ao povo da Igreja, nem aos Profetas - cujo número já está completo -, nem aos Apóstolos - por ter terminado o seu tempo.
.
De Arsênio, Valentino e Melcíades não recebemos absolutamente nada; estes também escreveram um novo livro de Salmos para Marcião, juntamente com Basíledes da Ásia...
...lacuna...
.
-----
Notas:
[1] Certamente, estas palavras finais se referem ao evangelho de Marcos, que não foi testemunha ocular dos acontecimentos, mas que conhecia muito bem os sermões de Pedro por ter sido seu discípulo.
[2]Ao usar a expressão "por alto" o autor deste escrito está querendo afirmar que Lucas omitiu esses atos por não os ter presenciado ou por não terem ainda ocorrido durante a redação dos Atos dos Apóstolos. No entanto, reconhece tais atos como fidedignos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário